quinta-feira, dezembro 28, 2006

TRECHO DO LIVRO QUE NÃO PUBLIQUEI NEM VOU PUBLICAR

Parte de uma entrevista concedida por Laszlo Canto, protagonista do proscrito O Partido do Indivíduo.


MC: Agora vivemos a sangrenta revolta dos excluídos. Mas limpemo-nos do sangue e caiamos em Rios, seu adversário mais direto, que têm demons­trado, juntamente com o próprio presidente, sua estranheza em relação à performance do PSDN. Dizem que por o governo ter conseguido baixar a inflação, manter uma moeda razoavelmente forte, estabilizar uma taxa de crescimento econômico, as pesquisas deveriam estar sendo mais genero­sas, gratas a eles. Acho até que se não tivesse aparecido o fenômeno Laszlo a eleição do ministro Rios já estaria consolidada. Desde já. O problema é que eles se recusam a reconhecer o fator Laszlo como produ­tor dessa conjuntura. Como você analisa isso e qual sua análise sobre o atual governo?
LC: Não sei se o “fator Laszlo” produziu essa frustração de expectati­vas no PSDN. Talvez estejam no limite, pois o custo da estabilização da economia foi muito alto para as classes média, média-baixa e baixa. Essa maioria não esquece o aperto por que passou. Os pequenos e micro­empresários — os que não faliram e os que efetivamente faliram — não esquecem os juros altos, restrições ao crédito e a reforma tributária, que foi boa só para o governo. A inflação caiu, maravilha. Mas a dívida interna aumentou, embora os especuladores estrangeiros dêem risada até hoje: era só chegar, faturar com juros dez vezes mais altos que a média internacional, sem compromisso de investir em criação de empregos, nem ajudar pessoas carentes, e ir embora. As privatizações foram tímidas, suspeitas e lentas. Uma privatização ou é rápida e suspeita ou lenta e segura. Conseguiram com que fossem lentas e suspeitas. Ficaram num medo terrível de sequer tocar no assunto “venda da Petrobrás, do Banco do Brasil, Vale etc.” E nós é que continuamos pagando a conta desses Frankensteins desajeitados, ótimos na prospecção de prejuízo e no refi­no da técnica de conceder privilégios descabidos aos seus funcionários. Coisas que empregados do setor privado conhecem apenas em sonhos ou nas histórias do sultão de Bagdá. Se nos livrássemos dessas fábricas de prejuízo, podendo, além desse alívio, faturar muito dinheiro, nos so­braria tempo e recursos para nos dedicarmos à educação e à saúde, por exemplo. Mas nosso presidente abandonou suas origens, afinal tinha de retribuir o esforço feito em seu favor por PVL e oligarquia ilimitada nas eleições. Assim, sua preferência foi justamente por aqueles que menos necessitam do governo para sobreviver. Necessitam para se manter acima da maioria. Maioria cujos membros desperdiçam suas vidas engolfa­dos na ignorância, plantados nas filas dos hospitais esperando horas, dias por um médico que ganha pouco e atende mal. Quando atende. O pre­sidente cedeu às pressões de latifundiários, banqueiros, especuladores, enquanto os professores permaneciam humilhados, os desempregados proli­feravam. Quem morre ou degrada-se primeiro? O latifundiário endividado — mas que tem seu patrimônio para socorrê-lo — ou o metalúrgico demi­tido — que vivia só de seu salário? Suas promessas não-cumpridas ser­viram para desmoralizar ainda mais os programas de governo. Daí aquela sua pergunta sobre quem garante que eu vou cumprir o programa do PLI. Mas fomos ingênuos em pensar que o presidente cumpriria suas metas ten­do feito as alianças que fez.

MC: Quem fez sua cabeça? Que autores — qualquer um — influenciaram sua formação? Ou ninguém influenciou?
LC: Digamos que não sofri influência ao ponto de passar a pensar como os autores que li. Mas cada um deles me abriu uma porta. Através de suas idéias era instigado a formular as minhas próprias, seguindo seu pensamento ou discordando parcial ou radicalmente. Nenhum fez mais mi­nha cabeça em particular. Sempre retirei o melhor de cada um.

MC: Alguns possuem mais o que se retirar.
LC: Correto. Tirei muito proveito dos velhos gregos, dos latinos, de Locke, de Mill, de Tocqueville, de Weber. Tirei proveito até de Marx. Aliás, dos esquerdistas herdei a preocupação pelo aspecto social. Tive sorte de ter crescido numa época menos maniqueísta. Pude acolher o me­lhor de dois mundos. Mas foi a história minha maior mestra. Ler história nos ensina como agir. E principalmente como não agir. Se fizesse um levantamento, verificaria que passei a maior parte de minha vida lendo do que fazendo qualquer outra coisa. Incluindo-se na conta o ato de dormir.

MC: Seu agnosticismo, seu pretenso assexualismo, sua condição celibatária, vá lá, também poderiam reverter-se em exemplos para os jovens?
LC: A possibilidade de alguém viver, ainda mais se esse alguém for o presidente, viver sem precisar submeter-se às convenções sociais, às pressões dos “normais”, pode sim servir de exemplo para quem sofra esse tipo de coação. Abomino os estereótipos, os padrões de comportamento. Veja o caso das crianças que dizem ter namorado ou namorada. Crianças de menos de dez anos, que apenas imitam os valores da sociedade. Sem informações sobre amor, sensualidade, apenas repetem, como animaizinhos amestrados. É uma forma de tirania também. A maioria das pessoas acre­dita não ter outra saída que não namorar, casar, trair. Muitas mulheres não vêem alternativa que não submeter-se. Questão de mentalidade. As pessoas falam de deus como se estivessem falando do padeiro da esquina. Como se os dois existissem igualmente. É uma superstição imposta desde a tenra infância: “vamos rezar pro papai do céu”. Posso ser um exemplo sim. Um exemplo de que posso ser ativo, útil — e até presidente — sem me apegar a crendices, bastando por mim mesmo. Você pode ser você mesmo e não o que seus instintos ditam. Pode ter certeza de que faço o que gosto. Não existem pessoas que gostam de jiló? Pois bem, além do jiló, dispenso a prática de muitas outras coisas, mesmo que 99% das pessoas delas não abram mão. Concedi-me o livre-arbítrio.

MC: Uma das qualidades que se admira no príncipe: o dar de si grandes exemplos, afora os grandes empreendimentos. Muitas pessoas, depois de atravessar um trauma violento, costumam mudar sua visão de mundo, mudar sua vida. E o que mudou no Laszlo pré e pós-acidente?
LC: Fiquei bem mais pobre em matéria de amigo. No mais, fora o tempo que passei longe do mundo, e o que desperdicei sem trabalhar, sou a mesma pessoa. Talvez menos tímido, mas devido a uma auto-superação, a uma constatação de que tanto faz conter-se ou não conter-se, reprimir-se ou não reprimir-se, pois o destino é implacável. Com os corajosos, com os audazes, com os covardes, com os fracos, com os fortes. Então façamos o que deve ser feito, não importando as conseqüências que pos­sam recair sobre nós. Virei um inconseqüente responsável, pois que os eventuais ônus provenientes de minhas ações — radicais, estabanadas, agressivas, o que seja — desabem sobre mim.

MC: Notável a naturalidade com que você fala. A mesma entonação para qualquer assunto. Onde está a grandiloqüência dos candidatos? Mesmo quando você falou em dar uma alma ao povo, esta afirmação foi proferida como se você estivesse dizendo “sim, eu gosto de arroz.” Isto denota uma humildade surpreendente. Você sempre foi humilde assim ou é uma “seqüela” do acidente?
LC: Sinceramente não sei responder a essa sua pergunta. Pelo menos para mim sempre fui assim. Não sei se sou humilde. Se disser que sou humil­de, estaria sendo vaidoso de minha suposta humildade. Já não seria, portanto, humilde. Acho que somente as pessoas que me conhecem poderiam responder a essa pergunta.

domingo, dezembro 17, 2006

O GOIÁS É O MELHOR TIME DO MUNDO, DIRIA O SR. SPOCK

No último dia 2 de dezembro, pela derradeira rodada do Campeonato Brasileiro da Série A, o Goiás foi até Porto Alegre e venceu o Internacional por 4 a 1. No dia 17 de dezembro de 2006, em Yokohama, no Japão, o mesmo Internacional venceu o Barcelona - campeão espanhol e europeu - por 1 a 0 e conquistou o Mundial de Clubes da Fifa.

Assim como na partida diante do time de Ronaldinho Gaúcho, o Inter jogou com sua força máxima em 2 de dezembro. Apesar de, àquela altura, o título nacional já estar decidido em favor do São Paulo, os colorados ainda disputavam o segundo lugar. E mais: o adversário na luta pelo vice era o Grêmio.

Em suma, a parte Nal do Gre-Nal jogou pra valer diante do representante do cerrado.

Dados jogados na mesa, quer se use a lógica vulcana, quer recorramos aos volteios silogísticos do capitão Kirk, não há como fugir da constatação de que o Goiás é hoje o melhor time deste planeta.

E, spocknianamente falando, num confronto com o Barça, o time de Goiânia venceria por 5 ou 6 a 1. Só não concorda comigo quem se deixa levar pela emoção...

sábado, dezembro 09, 2006

MAIS UM CONTO DIALÉTICO

Suscetibilidade

- Meu senhor, temos a conversa toda gravada. Nossa atendente não o ofendeu em momento algum.
- Claro que vocês vão dizer que ela não me ofendeu! Mas o juiz vai observar as entrelinhas e então vocês terão que reconhecer que fui extremamente atingido em minha honra!
- Calma, senhor. Ela nem mudou o tom de voz durante toda a conversa. Não houve nenhuma palavra que pudesse denotar qualquer tipo de ofensa. Por favor, nós...
- Acham que sou idiota? Claro que não há nenhuma ofensa explícita! Mas ela deixou implícita a ofensa! Está lá pra qualquer ouvinte imparcial perceber!
- Não vejo onde pode estar oculta qualquer insinuação...
- Mas o juiz vai ver! E eu quero ser muito bem ressarcido! Esse negócio me causou um tremendo dano moral! Estou muito abalado! Sabe quanto já gastei com analista nesta vida? Vocês vão pagar essa conta também, ouviu?
- A política da empresa é sempre tratar o cliente com o mais absoluto respeito e...
- Menos eu, pelo jeito!
- Não, não. Queremos continuar contando com sua parceria, senhor. Gostaríamos que o senhor...
- Também quero aquela... aquela... aquela mocinha despedida, ouviu?
- Calma, senhor. Aquela atendente é uma de nossas colaboradoras mais condecoradas. Já ganhou muitos prêmios de funcionária do mês...
- Por ofender gente como eu?
- Não, senhor. Nas horas vagas ela ainda cuida de velhinhos em vários asilos e presta assistência a vítimas carentes de hanseníase e Aids. Ninguém jamais a ouviu falar mal nem mesmo dos nossos políticos.
- Mas nas entrelinhas ela me transformou no mais vil e reles dos seres humanos! E ela vai pagar por isso! Ah, se vai!...
- Senhor, sejamos razoáveis...
- Arrá!
- Senhor?
- Agora você perdeu a cabeça e começou a me ofender também, né?
- Perdão, senhor...
- Não se faça de desentendido. Quer dizer que não sou razoável? Quer dizer que sou um monstro irracional, sempre prestes a explodir de fúria? Quer dizer que sou capaz de matar alguém num acesso de raiva? Quer dizer que sou paranóico, demente, psicopata e outras coisas ruins, hein?
- Eu não disse nada disso, senhor. Eu só...
- Cala a boca! Agora são dois processos: um em cima da mocinha e outro em cima de você! Danos morais, calúnia, injúria e difamação!
- Meu Deus, meu Deus...
- Na verdade, três processos. Tinha esquecido a empresa...

quinta-feira, dezembro 07, 2006

FUTEBOL: TEM PROPOSTA PRA GOIÁS TAMBÉM

Em cima da proposta anterior - que é de âmbito nacional - vai aqui uma específica para o futebol goiano:

PROPOSTA PARA QUE OS CLUBES GOIANOS MANTENHAM-SE EM ATIVIDADE DURANTE A MAIOR PARTE DA TEMPORADA

DE JANEIRO A MAIO - Durante este período o Campeonato Goiano continuará a ser disputado normalmente, mas com uma modificação: todas as divisões serão disputadas simultaneamente. Devido ao pequeno número de clubes profissionais em nosso estado, talvez fosse melhor que houvesse apenas duas divisões. Outra diferença em relação ao atual modelo: o Goianão não dará vaga a nenhuma competição nacional; existirá para apontar o campeão estadual e os melhores times e para selecionar quem sobe e quem desce de divisão.

DE MAIO A SETEMBRO - Todos os clubes profissionais do estado, de todas as divisões, serão convidados a participar de uma copa (que poderá ser chamada de Copa Goiás, Copa Pedro Ludovico etc.) que classificará os melhores para a Copa do Brasil e para o Campeonato Brasileiro da Série C. Os clubes que já estiverem nas séries A ou B, poderão participar, se quiserem, com seus times reservas, mas não terão direito à classificação - só ao título -, pois, de acordo com esta proposta, os times das duas principais divisões do Campeonato Brasileiro terão vagas garantidas na Copa do Brasil. Os torneios seletivos serão organizados pelas federações estaduais.

DE SETEMBRO A DEZEMBRO - Neste período serão disputadas simultaneamente a fase nacional do Campeonato Brasileiro da Série C (organização da CBF) e uma nova seletiva para a Copa do Brasil (novamente sob a direção das federações). Este novo torneio classificatório será disputado pelos clubes que não conseguiram passar para a fase nacional da Série C. Os que conseguiram obtiveram também classificação para a Copa do Brasil da temporada seguinte.

FUTEBOL: MEUS PITACOS

Há alguns anos escrevi na Folha do Sudoeste uma série de artigos em que detalhava uma proposta de reformulação do calendário do futebol brasileiro. Foi um troço amplo e cheio de minúcias. Também mandei a proposta para a CBF, mesmo sem esperança de que o panorama fosse mudado. Tinha razão em minha desesperança. Nada mudou. De bom mesmo, de lá pra cá, só a adoção do sistema de pontos corridos e turno e returno no Campeonato Brasileiro das séries A e B. Mas times pequenos como a gloriosa Associação Esportiva Jataiense continuam paradas a maior parte do ano.

Agora dois fatos me motivaram a voltar à carga. Um deles na verdade já tem quase três anos: o Estatuto do Torcedor, que obriga as entidades dirigentes do futebol a fazer com que os clubes profissionais tenham no mínimo 10 meses de atividade por temporada. O outro fato é a recente proposta da Fifa de alterar o calendário futebolístico dos "europos". Quem nem nós, eles poderão jogar de fevereiro a novembro. Ou seja, a Europa se curva ao Brasil... Assim, tive de refazer minha proposta, que originalmente passava pela nossa adaptação ao calendário "velho-múndico".

Bem, mas vamos ao que interessa:

PROPOSTA DE CALENDÁRIO PARA COMPETIÇÕES NACIONAIS

PROBLEMA 1: Federações e CBF não cumprem o Estatuto do Torcedor, que determina que as entidades garantam o mínimo de 10 meses de atividades a todos os clubes de futebol profissional do país.

PROBLEMA 2: Disputa da Copa do Brasil e das copas Libertadores da América e Sul-Americana em apenas um semestre aperta o calendário e, no caso da competição brasileira, restringe o número de participantes.

PROPOSTAS PARA A SOLUÇÃO DOS PROBLEMAS DADOS:

1) Adoção de um período (de maio a setembro, preferencialmente), entre o final dos campeonatos estaduais e o início da fase final do Campeonato Brasileiro da Série C, durante o qual serão realizados torneios estaduais seletivos, ao mesmo tempo, para a Série C e para a Copa do Brasil da temporada seguinte. Os melhores de cada unidade da Federação (UF) totalizarão os 64 participantes da fase final da Série C, que será disputada de setembro até o início de dezembro. Esses 64 clubes também estarão automaticamente classificados para a Copa do Brasil da temporada seguinte. O número de clubes classificados por UF deverá obedecer a um ranking nacional. Assim, São Paulo, por exemplo, teria cinco vagas, Rio de Janeiro, três, e assim por diante, desde que cada unidade da Federação tenha no mínimo duas vagas asseguradas. Nesses torneios seletivos estaduais - que poderão ser chamados de Copa Federação, Copa Fulano etc. - poderão participar todos os clubes profissionais de cada UF, não importa a que divisão pertença a agremiação. A fórmula de disputa fica a cargo de cada entidade estadual. Em São Paulo, por exemplo, devido ao grande número de clubes, poderão existir grupos regionalizados.

2) Para que os clubes eliminados da fase final da Série C nacional não fiquem sem atividade até o final da temporada, eles serão convidados a disputar, de meados de setembro até o início de dezembro, uma nova seletiva estadual para indicar as vagas restantes (uma por UF) para a Copa do Brasil da temporada seguinte. É primordial que essa competição nacional passe a ter 128 ou mais participantes. Disputada o ano inteiro, em jogos de ida e volta, com 128 times ela usaria apenas 14 datas. Terão vaga garantida os 40 participantes das séries A e B, os 64 da fase final da Série C e mais 24 oriundos da seletiva final. Se todas as unidades da Federação realizarem suas respectivas seletivas finais, teríamos, portanto, 27 classificados. Nesse caso, na temporada seguinte, haveria uma pré-Copa do Brasil, em que, por sorteio, alguns dos clubes que jogaram a seletiva final - de setembro ao final da temporada - se enfrentariam em mata-mata pelo direito de ficar entre os 128 participantes da Copa do Brasil.

3) Com uma Copa do Brasil com 128 participantes, é necessário que essa competição seja disputada ao longo de toda a temporada e não apenas em um semestre, como acontece hoje. Desse modo, precisando de 14 datas, com no máximo duas rodadas por mês, nos meios de semana, a Copa do Brasil poderia começar em fevereiro e terminar em agosto ou setembro, ou seja, seu clímax continuaria longe das rodadas finais do Campeonato Brasileiro. Com isso, as emoções permaneceriam distribuídas ao longo da temporada (lembremos das emoções dos campeonatos estaduais, com final em maio). Em ano de Copa do Mundo, a Copa do Brasil poderia terminar em outubro.

4) Um calendário mais racional também pede que as copas Libertadores e Sul-Americana sejam disputadas ao longo do ano e com participantes diferentes. Hoje o maior entrave a uma mudança nessa direção é a Argentina, que segue - mais ou menos - o calendário europeu. Mas, como os europeus estão propensos a alterar seu calendário, com campeonatos de fevereiro a novembro, ficará mais fácil convencer nossos vizinhos a fazer o mesmo. Com rodadas mais espaçadas nos torneios continentais, os melhores clubes brasileiros poderão voltar a jogar a Copa do Brasil sem sofrer com o excesso de jogos.

PROPOSTA DE CALENDÁRIO - RESUMO

JANEIRO A MAIO
Campeonatos estaduais - todas as divisões
Primeiras rodadas da Copa do Brasil e das copas Libertadores e Sul-Americana

MAIO A SETEMBRO
Torneios seletivos para a Série C nacional e Copa do Brasil da temporada seguinte
Primeiro turno do Campeonato Brasileiro - séries A e B
Rodadas finais da Copa do Brasil

SETEMBRO A DEZEMBRO
Fase final da Série C nacional
Rodadas finais da copas Libertadores e Sul-Americana
Rodadas finais do Campeonato Brasileiro - séries A e B
Seletivas finais estaduais para a Copa do Brasil da temporada seguinte

sexta-feira, novembro 24, 2006

UM CONTO... FICÇÃO PRA QUEBRAR O GELO

Sinceridade

- Olá, pai. Que bom que tirou o gesso.
- Pois é. Não estava agüentando mais aquele troço.
- É um saco...
- Sabe, filho, durante esse tempo todo parado eu pude pensar em um monte de coisas, rever conceitos e... Sei lá... Uma das coisas que resolvi fazer é falar o que penso.
- Sinceridade total?
- Absoluta. Quero ser franco e honesto o tempo todo daqui por diante.
- Por quê, pai?
- Não sei explicar direito. Também não importa. E já vou começar revelando que eu nunca gostei de você, filho.
- Eu já sabia.
- Já?
- Sim.
- Por que nunca falou nada?
- Porque franqueza total e absoluta pode ser fonte de muito sofrimento.
- Tem razão. Mas, apesar de não gostar de você, tenha a certeza de que o admiro e o respeito muito. Você é o filho que todo pai gostaria de ter: honesto, obediente quando criança, estudioso, generoso, bom pai, bom marido...
- Sei disso, pai. Apesar de tudo, vou continuar amando o senhor, embora saiba que o senhor também não gosta dos outros...
- É verdade. O Juninho, aliás, eu odeio. Sempre o detestei. Ele é um bom garoto, simpático, gosta de trabalhar, faz amigos com intensa facilidade, só quer o bem de todo mundo, mas...
- Mesmo assim o senhor nunca encostou um dedo nele. Em nenhum de nós, é bem verdade. Sempre foi um bom pai: compreensivo, comunicativo, participante, nunca deixou faltar nada...
- É minha obrigação de pai. Vocês todos são ótimos, com exceção de sua mãe.
- Pô, pai! Vai me dizer que também não gosta da mamãe?
- Claro que não.
- Agora foi demais pra mim. Eu vou embora. Tenho que pegar os meninos no colégio.
- Aliás, parabéns.
- Hã?
- Parabéns pra você e pros seus irmãos. Vocês estão criando seres maravilhosos, pessoas que terão um futuro maravilhoso. Meus netos puxaram meus filhos, o que só me enche de orgulho.
- Mas o senhor não gosta deles, não é?
- De nenhum deles.

quinta-feira, novembro 09, 2006

A ESTRÉIA DE PRATÃO E PIPÓCRATES

Filósofos de rua em tempo integral, Pratão e Pipócrates discordam em tudo, mas um sentimento os une: o ódio a Aristóteles Omorris.

- Pipócrates, meu velho, o mundo vai acabar mesmo...
- Por que capetas tu tá falando isso, Pratão?
- Sabe o que minha filha caçula falou pra mim?
- “Pai, me dá dinheiro”.
- Antes fosse isso... Ontem cheguei na hora do almoço e pedi: “Me frita um ovo?”
- E ela?
- “Tá. O da direita ou o da esquerda?”
- AHAHAHAHAHAHAHAHAHAH!!!
- Pode um negócio desse?
- Achei que tu fosse falar de um troço mais transcendental, algo grandioso, espetacular... Como o Evo Morales.
- Bleargh!
- Sinal dos tempos é o que ele fez.
- Como assim?
- Suponhamos que minha casa tivesse espaço de sobra e eu te chamasse pra construir um puxadinho nos fundos. Você construiria um quarto, um banheiro e ainda faria mais: ajudaria na reforma da minha casa. Tu ainda pintava o muro, cuidava do jardim, fazia o almoço e pagava luz e água. Tu até comprava geladeira, TV de plasma, fogão seis bocas, aparelho de som. Era tudo seu, mas deixava a gente lá em casa usar tudo até tu tê casa própria. Mas aí, certo dia, eu cismo que tu tem que ir embora. Não te quero mais em casa! E, além de te expulsar, falo que vou ficar com sua geladeira, sua televisão etc. E não vou pagar pelas benfeitorias que tu fez. No máximo, num futuro qualquer, vou te pagar um valor simbólico por tudo. E tu não tem direito a espernear. O que tu faria?
- Deixa eu ver... Ah, te matava umas trinta vezes...
- Foi mais ou menos isso que o Evão fez com a gente. E nós aplaudimos.
- Não é bem assim... No caso que tu criou não há um contexto histórico de séculos de exploração e...
- Qualé?! Tá parecendo o bundão do Totó!
- “Totó?”
- Ué, esqueceu o apelido do Aristóteles?
- É mesmo... E ele odiava ser chamado de Totó.
- Uma temporada turística de dez anos pra ele na Bolívia.
- Vá com o diabo, Totó.

domingo, outubro 29, 2006

MAIS UM TRECHO DE "A CONFRARIA DOS HOMENS DE BEM"

Quase meia-noite na boate Rapsódia. Cotovelos no balcão, Abel parecia conhecer apenas dois movimentos: mover a cabeça na direção do relógio e o­lhar para todos os lados como um coelho que fareja freneticamente o ar em busca dos cheiros exalados por seus predadores. Na verdade Abel assemelhava-se mais a um mineral inerte em comparação com o modo com o qual se retorciam os corpos jovens que praticamente enchiam o lugar. Já estivera ali várias vezes, em situações bem menos tensas e desagradáveis, com Renato Zola e ou­tros amigos, mas principalmente com mulheres das mais variadas estirpes.
Já havia se passado seis minutos depois da meia-noite. O volume do som era tão alto que Abel não ouviu aproximar-se o homem que veio se sentar à sua esquerda. Quando se virou para esse lado, em seu estilo roedor, assus­tou-se ao deparar com o rosto do emissário.
— Esperava outra pessoa, Abel?
Após alguns momentos de indecisão, Abel apertou a mão que lhe fora es­tendida. Era o que devia fazer, se quisesse acabar rapidamente com aquilo.
— Desculpe-nos se o fizemos esperar. A gente tinha de analisar o ter­reno, ver se vieram amigos seus. Você sabe... A gente precisava ter seguran­ça. Mas você é um homem de palavra. Parece estar mesmo disposto a colaborar.
— Se não estivesse, não viria.
— Claro, claro. Para começar...
— Espere um pouco. O dinheiro é bom mesmo?
— Claro que sim. Você não vai ter de se preocupar mais com isso para o resto da sua vida. Pode confiar. Vamos fazer o seguinte, já que você está meio ressabiado... Que gata, hein? — disse apontando com os olhos a jovem vestida com trajes sumários que começou a dançar perto dos dois. Falando mais baixo e mais próximo a Abel, prosseguiu: — Comece liberando um ou dois nomes, os nomes de quem ordena quem deve morrer. Daí você recebe a primeira parcela. Depois você passa outros nomes, dá detalhes dos mecanismos, essas coisas. Então recebe mais. Fica tudo a seu critério. Que tal?
— Interessante. Quer três nomes logo de cara?
— Por que não?
— Aqui estão os primeiros três — disse Abel, retirando um pedaço de papel do bolso da calça. — Leia discretamente.
Ávido, o emissário abriu o papel.
— “Atos, Portos e Aramis”. Que diabo é isso?
Foi nesse exato instante que Abel estalou os dedos, aparentemente sina­lizando para o barman, enquanto o emissário, antes que pudesse dizer mais alguma coisa, antes que pensasse em reagir, teve seus movimentos paralisados por um cano de uma Magnum 45, que de repente percebeu estar encostado em sua têmpora direita. Pelo canto do olho percebeu que quem segurava a arma era a graciosa jovem que dançava ao seu lado.
— Você não vai escapar dessa, Abel — disse o emissário. — Tem mais gente comigo aqui.
Imediatamente três homens sacaram seus revólveres. Um deles, notou A­bel, partilhava muitas características com o atirador descrito por Gleusa. Agora que apontavam suas automáticas para Abel e para a moça, estavam iden­tificados, o que tornou mais fácil o trabalho de cerca de metade dos fre­qüentadores da boate, que também apontou suas armas para os homens do emis­sário. Estes, numa desvantagem de um para dez, não tiveram outra saída que não largar seus instrumentos de trabalho. Da cabine de som o dono da boate pedia calma aos verdadeiros clientes.
— Fica frio todo mundo. Tudo não passa de uma pequena ação policial.
Algemados, os quatro homens saíram escoltados pelos numerosos e jovens “policiais”, que ainda foram agraciados por aplausos entusiásticos de pesso­as não completamente refeitas do impacto causado pela ação fulminante. Uma vez no lado de fora, o quarteto foi rapidamente separado e colocado em dois carros com motorista e dois outros homens armados, cada. Quem viu não pres­tou atenção ao fato de que os carros não eram da polícia. Se alguém perce­beu, não se importou. A maioria dos participantes da ação dispersou-se pela noite paulistana, mimetizando-se com as pessoas comuns. Antes de se dirigir ao carro no qual Raful o esperava — e que seguiria os dois primeiros —, Abel aproximou-se da moça que apontara sua arma para a cabeça do emissário.
— Um instante, por favor. Sabe do que tenho medo de perguntar? Onde você escondia aquele trabuco.

domingo, outubro 08, 2006

HUMOR: DE NOVO, ARISTÓTELES OMORRIS

Se eu fosse americano, teria uma
estátua em cada mictório público

Aristóteles Omorris

Jataí, Sudoeste goiano, Goiás, Centro-Oeste, Brasil, América do Sul, Américas, Hemisfério Sul, Hemisfério Ocidental, Terra, Sistema Solar, Via Láctea, Universo, Vila Santa Maria - Ninguém é santo em sua própria terra, já dizia o velho deitado. Homem venerado em todos os cantos do mundo, cantado em verso, prosa e rap pelos povos de todos os 437 países que já visitei, eu, o incrivelmente modesto Aristóteles Omorris, sou prática e injustamente ignorado em meu próprio e pérfido torrão natal.

É espantosa a ingratidão do brasileiro médio (e medíocre, no caso do titular deste blog). Enquanto passeio - com o nariz tapado, evidentemente - pelas ruas de nossas encardidas cidades, jamais em década alguma alguém se aproximou para dizer um mísero e reles “obrigado”.

Tudo que pediria - mas não prostrado; apenas ajoelhado - era que as pessoas dissessem um sucinto e sincero “obrigado por existir, excelentíssimo, magnífico, estupendo, fantasticamente superior, ofuscantemente lindo, guia extremado dos povos, benefactor da humanidade e ex-campeão de cuspe a distância Ilustríssimo Sr. Aristóteles Omorris”.

Só isso. Que que custa?

Em minha soberba humildade, nunca reclamei o reconhecimento pelos meus mais altos feitos. Nem mesmo quando representei com enorme competência e galhardia o nome de nosso país no exterior. No entanto, os invejosos - certamente liderados por Francisco Cabral - trabalharam para manter tais glórias em indecente anonimato.

Ninguém perguntou, mas vou deixar um pouco a modéstia de lado para relatar uma das vezes em que fiz reluzir o nome do nosso país em terras alienígenas.

Todos devem se lembrar do estranho desaparecimento da mais cara e valiosa coleção de diamantes do mundo, em Londres, há oito ou doze décadas. Profissionais de várias nações se uniram para perpetrar o perfeito roub... quer dizer, a perfeita subtração das preciosas pedras.

E sabe quem era o solitário representante das nossas cores nacionais? Não, ninguém sabe, pois nossa mesquinha mídia fez questão de não revelar que havia no grupo de assalt... ou melhor, de especialistas em extração à revelia de propriedades alheias, um digno nativo verde-amarelo. E tal nativo era o autor destas maravilhosas linhas. Isso mesmo: papai aqui! E qual foi o agradecimento pátrio por eu ter feito bonito lá fora naquela e em outras oportunidades? Zero! Nada! Rosca!

É por essas e outras que, neste segundo turno, continuo ao lado daquele que sempre reconheceu meu valor e que prossegue utilizando-se de meus serviços e de meus métodos. Pau neles, meu rei!

Aristóteles Omorris é tão pobre e deprimido que este será seu epitáfio: “Só não cortei os pulsos porque estava sem dinheiro para comprar gilete”




Arquivo pessoal:
Aristóteles Omorris
quando foi "convidado" a
passar um longo tempo afastado
do convívio em sociedade.
"Foi apenas para
espairecer e colocar
as idéias em ordem",
alegou o colunista

quinta-feira, outubro 05, 2006

TRECHO DE "O AMIGO DE PRAGA"

Pela manhã Etê queria ele mesmo retirar a bala com um alicate comum.
Sua pele não fora perfurada, mas afundada entre duas costelas em cerca de três centímetros. Mas Dennis convenceu-o a procurar o médico. No carro, a caminho da cidade, ainda tinham o que conversar.
— Como foi aquela história de apagar os sujeitos com um golpe só?
— Foi o resultado da combinação de alguns cálculos que eu fiz levando em conta a força e a precisão necessárias para provocar um desmaio no oponente. Considerando-se peso e altura aproximados dos adversários, aplica-se um golpe com determinada força num ponto restrito de sua nuca.
— Você andou estudando anatomia, física, essas coisas, não?
— Andei estudando tudo o que é passível de ser estudado.
— No que está com toda razão. E agora? Vamos continuar defendendo os fracos e oprimidos?
— Você fala com a tranqüilidade dos que foram apenas dar um passeio. Como se agredir pessoas fosse uma brincadeira.
— Não, eu...
— Sim, eles eram bandidos, mas suponha que eles vivessem numa sociedade justa, sem brutais diferenças sociais, sem um abismo entre ricos e pobres, em que todos tivessem oportunidades de viver condignamente. Nesse hipotético caso, eles recorreriam a uma atividade de altíssimo risco que é o crime? E certamente há um cérebro por trás de tudo, comandando as ações. Pelo linguajar simplório, pode-se perceber que eles não passavam de subalternos.
— Com estas prisões o delegado poderá chegar ao mandante.
— Sinto-me mal por tê-los agredido. A dor provocada pelo tiro não é nada comparado ao sofrimento por ter causado sofrimento a outrem.
— Você fez o que era preciso numa situação extrema. Só conversa não os convenceria a voltar para casa e procurar emprego.
Já no consultório, munido de uma pinça, em poucos minutos Conrado retirou o projétil encravado.
— Etevaldo, meu velho, vai ser preciso um fuzil dos bons pra furar sua couraça. E olhe lá. Só estou em duvida é sobre o tempo que vai levar pra sua pele voltar ao normal, porque afundou e arroxeou o local. Se é que vai voltar ao normal. Isso pra mim é novidade.
— De qualquer forma, obrigado, doutor.
— Vai vestindo a camisa. Eu vou falar com o Dennis lá fora.
Dennis, na sala de espera, lia uma revista quase tão velha quanto ele mesmo.
— Dennis, meu garoto, o que vocês fizeram foi uma loucura. O Inácio já deve ter dito pro delegado que quem acabou com o assalto foi um magrelo alto e cabeçudo acompanhado de um indivíduo mais jovem. Logo, logo baterão na porta do seu avô. Quem mais no estado todo se encaixaria nessa descrição? Daí vão investigar o Etê, vão descobrir que ele não tem documento nenhum, que não é tcheco coisa nenhuma. Então vão ligar sua aparência com a do piloto morto daquela nave e pronto.
— Seria terrível. Teremos de estar preparados. Mas não é isso que me preocupa mais, doutor.
— Então é o quê, criatura?
— E se o Etê tiver sido mandado para iniciar um processo de invasão do nosso planeta? Já pensou um batalhão, uma população inteira de seres como ele? Nós seríamos dominados como um grupo de crianças por um pelotão do exército.
— Difícil imaginar alguém como o Etê com um propósito tão sinistro.
— Por melhores que sejam, soldados cumprem ordens. O problema é quem dá as ordens. O problema é que não conhecemos a personalidade do Etê integralmente. Muito menos a de seus conterrâneos. E se for um povo onde o mau-caratismo domine?
— Pára com isso, Dennis! Você me provoca calafrios com essas suas suposições. Venha, vamos ver nosso amigo.
Ao entrar no gabinete depararam-se com Etê imóvel sobre a maca. Em suas mãos, o estetoscópio de Conrado, objeto que o alienígena fitava como se o estudasse detidamente. Absorto, demorou para perceber que havia alguém ao seu lado.
Tanto Dennis como Etê passaram o resto daquela manhã e quase toda a tarde mais pensativos, mais sombnos, eles que sempre eram tão alegres. O clima lúgubre só foi quebrado pelas noticias trazidas por Juraci.
— Ocêis tá sabeno o quêqui aconteceu?
Dennis sobressaltou-se. Em sua cabeça não tinha mais dúvidas: toda a cidade, toda a região estavam a par do que ocorrera na madrugada anterior. Era questão de tempo a policia chegar para fazer algumas perguntas. Logo depois viria um ávido e truculento destacamento da Aeronáutica.
— O que foi, homem de Deus? — impacientou-se Prudente. — A mulher do padre pediu divórcio?
— Que que isso, seu Pruderite? Isso é pecado, sabia.
— Fala, Juraci — suplicou Dennis.
— Uai, sô, o delegado prendeu a cambada qui tava robano gado. Diz qui quem prendeu de verdade memo foi o seu Inácio e a piãozada dele.
— O quê? — surpreendeu-se Dennis, com uma ponta de indignação.
— Foi o qui o delegado falô. Diz qui o seu Inácio distribuiu purretada na cabeça dos hômi. Os pião acordô cum os grito e foi lá e terminô o sirviço. Aí o seu Inácio pegô a carabina dêze e mandô os otro ficá bem quetin. Adispôis amarrô os bandido e chamô a puliça.
— O Inácio? Com aquela barriga? — estranhou Prudente.
— E os bandidos? — quis saber Dennis. — Confirmaram a história?
— Diz qui um dos lalau falô qui o capeta tava do lado do seu Inácio, um fióte de cruiscredo do tamãi dum poste qui bala ninhuma num dirrubava. Otro falô qui era um pião do seu Inácio qui tava de tôca infiada na cabeça. Aí o seu Inácio falô qui éze tava tudo era variano pur causa das pancada no coco. Tinha uns qui foi pego na gabina e viu de perto o mascarado, mais tava iscuro e êze tava mais percupado era ca carabina do seu Inácio.
— O delegado não desconfiou de nada? — perguntou Dennis, tentando disfarçar seu exacerbado interesse.
— Ele ficô mêi anssim. Diz qui ele ficô mêi sem sabê cumequi uns cinco hômi disarmado pode dá conta de oito bandido cheio duns trabuco. Mais a famía do seu Inácio garantiu qui foi tudo verdade verdadera memo.
Para espanto de Prudente e pasmo e terror de Matilde, a dupla aventureira, logo após o jantar, contou-lhes toda a verdade. Verdadeira.
— Sabia que o Inácio tava de lorota — disse Prudente.
— Mas que perigo! Como vocês tiveram coragem de... Ah, meu Deus. Tá doendo muito, Etevaldo? Que seja só essa vez, viu? Não quero saber de vocês arriscando a vida por aí, não? Principalmente você, mocinho — disse Matilde, olhando severamente para Dennis. — Onde já se viu? Você nem tem pele que nem daquele bicho... como é que chama mesmo? Rorio... rino... renoceronte!
— Viva a vaidade humana! — comentou mais tarde Dennis. — Graças a ela seu Inácio fez por nós o trabalho de despistar a polícia. Ele deve ter combinado a mentira com seus peões e a família. Coisa feia... e bem-vinda.
— Fico me perguntando qual a vantagem que Inácio Caldas pode angariar ao assumir a detenção dos ladrões — disse Etê.
— Fama, prestígio, admiração...
— E daí? Sua vida vai melhorar com esses ingredientes? Ele vai tornar-se uma pessoa melhor, mais plena, mais feliz?
— A glória é a mãe das histórias de pescador. Ainda que falsa. É um meio de se eternizar mesmo que em forma de lenda.

segunda-feira, setembro 25, 2006

ARISTÓTELES NAS ELEIÇÕES

Sempre fui contra a corrupção. Quando me pagaram

Aristóteles Omorris

Perolândia, Texas - Aqui, do alto dos meus dois PhDs de la Sorbonne, posso ter um vislumbre mais claro no que tange às eleições brasileiras. Daqui de cima posso ver o movimento dos candidatos, embora eu esteja em nível tão elevado que eles pareçam umas formiguinhas lá embaixo.

Ninguém melhor que eu para cobrar ética na política e também nos aspectos limpos da sociedade. Afinal, já fui honesto.

Recomendo com overdósica veemência que a oposição recolha seus foguetes e pare de comemorar a repercussão desse caso do dossiê. Isso não vai mudar o resultado da eleição. Explico: quem é contra a corrupção e a favor da ética já não ia mesmo votar pela reeleição. Nós, que não ligamos pra esse tipo de coisa, não iríamos - e não vamos - mudar nossa opinião só por causa da revelação de mais um caso grave de desvio de conduta.

E eu tenho moral para dizer que tenho um candidato, pois sou um homem de imprensa, que sabe que deve permanecer neutro, ter uma visão imparcial das coisas. Enfim, que se exploda a oposição!

Apesar de jovem e ainda extremamente perseguido (e apedrejado) pelas mulheres, conheci muitos políticos importantes em minha vida. Na infância, por exemplo, brinquei de bolita com o marechal Deodoro da Fonseca, que mais tarde seria o homem a cometer o famoso Grito do Ipiranga. “Ipiranga, seu ladrão, devolve meu álbum de figurinhas do Chaves!”, gritou Deodoro certa vez.

Também ensinei muito ao jovem Gandhi e ao menino Bin Laden, dois exemplos da convivência pacífica com os diferentes. Assim como todos os grandes homens públicos, sofri bastante com agressões oriundas das fétidas bocas dos adversários. Fui chamado de ladrão por Maluf, Nixon, Ademar de Barros, Collor, Jader, Severino e pelo ditador filipino Ferdinando Marcos. Ninguém aceita ficar para trás em termos de band... Quer dizer, de competência administrativa.

Por tudo isso digo que o Brasil não precisa mudar. Afinal, meu último pupilo está fazendo um trabalho magnífico. Fora que está me recompensando regiamente, admirado da minha visão sensata e isenta das coisas.

Aristóteles Omorris esconde o leite, mas tem muito mais que dois títulos de PhD (Péssimo homem - Desvie)

quinta-feira, setembro 14, 2006

TRECHO DE "A CONFRARIA"

A campanha aproximava-se do final. Naqueles dias as dúvidas restringiram-se a saber quem seriam os governadores, senadores e deputados. Fausto Rosa já era chamado em toda parte de presidente virtualmente eleito. Em uma entrevista coletiva em Porto Alegre já nem perguntavam sobre aspectos de campanha: faziam-se conjecturas sobre como seria o país e o mundo com Rosa no poder.
— Presiden... Ou melhor, deputado — disse um repórter —, o senhor está sendo considerado um fenômeno de nível mundial. O mundo político só fala do “fenômeno Rosa”, discute sua espetacular ascensão e suas idéias. De alguma forma esse alvoroço poderá trazer benefícios ao país?
— Toda notoriedade desprovida de aspectos negativos é benéfica. Esse alvoroço de que você falou pode funcionar como um quebra-gelos para nosso governo, pode facilitar nosso trânsito internacional. Mas o que importa de fato é cumprirmos nossas metas para conosco. O resto é conseqüência. Espero que o mundo seja inundado de conseqüências benéficas por causa de nosso tra­balho. Os americanos intervieram no Vietnã temendo um efeito dominó: se o comunismo imperasse ali, poderia espalhar-se para os outros países do Sudeste asiático. Pois esperamos deflagrar um efeito dominó positivo: começando, pela proximidade, com os países latino-americanos. Esses povos verão que, se nós podemos, eles também poderão. Depois a febre se alastrará pelo mundo inteiro.
— Um continente como a África vai precisar de algo além de inspiração.
— Tem razão. Há muito a fazer pela África. Precisamos levar para lá o discurso da tolerância. É um continente repleto de lutas fratricidas, tribo contra tribo e até escravidão. Uma situação que não leva a nada. Todos somos iguais e o que importa é que estejamos todos vivos e bem. Não importa a que tribo pertença­mos. Por que não viver e respeitar que o outro viva, como mais ou menos dis­se Hegel? Algo parecido com a velha e sábia máxima: “não faças aos outros...” O que sempre fiz a vida inteira. Ou tentei, busquei: não fazer aos outros o que não gostaria que fizessem comigo. Um ensinamento, como gosto de repetir sempre e sempre, ainda que com algumas variações, presente em várias filosofias, não só na cristã. Mesmo Kant a enunciou.
— Mudando de assunto, deputado, o senhor acha que a tendência do esta­do nacional é sumir?
— Quanto ao estado do tipo atual, sim. Só não concordo com aqueles que dizem que processos como a globalização e a disseminação das tecnologias acabarão com as fronteiras, reduzirão o papel dos governantes, exterminarão a democracia representativa.
— Na sua opinião isso não acontecerá?
— Bem, tudo pode acontecer. O estado nacional pode até desaparecer, mas a democracia, não. Porque... Vamos pegar nosso exemplo aqui. Em nosso virtual governo (agora é moda utilizar o termo “virtual”), em nossa virtual gestão, municipalizaremos os serviços públicos. Cada município cuidará da saúde, da educação, seguindo as diretrizes do governo federal. Outros servi­ços serão terceirizados, privatizados. O cidadão paga uma taxa a uma empresa privada para ela recolher e tratar o lixo, por exemplo. A energia, as tele­comunicações, as rodovias, ferrovias, enfim, tudo será privatizado, mas sob o olho vigilante da sociedade, representada pelo estado. Assim que a respon­sabilidade administrativa estiver entranhada nas mais recônditas localida­des, quando elas puderem existir por conta própria, o governo federal poderá deixar de existir. Os governos estaduais hoje em dia o que são? São pratica­mente as lupas do governo federal: fiscalizam mais de perto o que municípios e setor privado estão fazendo com os serviços. Vai acabar o governador toca­dor de obras, comandante de uma multidão de funcionários. Os governos esta­duais serão algo como os ministérios deveriam ser — e o serão em nossa ad­ministração: departamentos enxutos com poder de coerção sobre quem estiver prejudicando a sociedade, abusando dela. Com o tempo, com o total amadureci­mento dos administradores das cidades, com uma ainda maior participação da comunidade, o governo estadual também perderá a razão de ser.
— Então o senhor acha que vai haver uma municipalização do mundo?
— Num prazo longo, pois algumas nações simplesmente não podem prescin­dir de um estado, pois ficariam a mercê de povos de cultura ainda refratária a uma globalização, a uma desfronteirização, povos de estados ainda com sede expansionista, colonizadora, catequizadora, que aproveitariam para atacar seus vizinhos sem comando central. Mas creio num futuro de cidades-estados, em que dos estados, das nações restem somente os nomes. Nome para facilitar a localização geográfica, histórica. Mas as relações ocorrerão entre indivíduos, empresas, instituições e cidades. Um mundo livre da xenofobia, que é um sentimento primitivo, resquício da primeira luta de tribo contra tribo.
Pela primeira vez desde que se iniciara a entrevista, Abel, que estava ao lado de Rosa, resolveu olhar com mais atenção para os jornalistas que abarrotavam a modesta sala cedida pelo sindicato dos bancários. Quando vasculhavam o fundo do recinto, seus olhos detiveram-se ao se deparar com feições familiares. Era Paula Chagas. Trocaram acenos. Pena que ela estivesse acompanhada de seu agora marido.
— Você quer um parâmetro? — prosseguiu Rosa em sua longa resposta. — Haverá estado enquanto houver exército. Este vai acabar quando o último general for para a reserva. Quando não houver por que entrar em guerra. Enquanto houver um excluído da sociedade, haverá estado. Enquanto houver uma pessoa sem atendimento médico ou analfabeta, deve haver estado. Isto se a justiça for um valor eterno. E espero que seja. Portanto, o estado deve estar sempre onde houver um desequilíbrio. Mas não deve criar embaraços à vida de quem viva e deixe viver. Sabem com o que devemos nos indignar? Nós, homens e mulheres de bem, não podemos mais aturar que um por cento da população viva à tripa forra e cinqüenta por cento na miséria. Evidentemente você não pode mudar o caráter, a índole das pessoas. Mas a reforma do estado, seus atos, seus feitos, seu exemplo, podem criar um padrão ético para a sociedade. De qualquer forma garanto-lhes que o estado brasileiro deixará de abonar e de estimular uma condição de degeneração ética. Não será por causa do estado que ainda existirão pessoas que batem nos filhos, que recorrem a drogas, que matam. O cafajeste o é por conta própria. Mas os valores éticos aos poucos dominarão toda a sociedade.
— Deputado, é verdade que o senhor abolirá o uso de fotografias do presidente em todas as repartições públicas?
— Se fosse possível, acabaria com a antiga veneração por chefes, por líderes, baseada nas hierarquias tribais, militares, religiosas. Acabarão os tratamentos majestáticos das cerimônias públicas, dos ofícios. Não exis­tirá mais mais aquela história de excelentíssimo senhor presidente, excelen­tíssimo senhor ministro. É só presidente, só ministro, só juiz, só prefeito, vereador, governador. Só “você”. Ninguém é melhor que ninguém, não. Você perguntou sobre retratos oficiais: outro item a ser abolido. Desde meu pri­meiro dia de governo não mais haverá a foto do presidente em toda repartição pública. Além do que, não há tantas moscas assim para serem espantadas nos asseados escritórios oficiais.
Encerrada a entrevista, Abel foi até onde se encontrava sua antiga su­bordinada para as saudações habituais entre conhecidos que não se vêem há muito tempo. E para trocar um cumprimento frio com o quase desafeto.
— Onde está seu gravador? Não veio falar com o Fausto?
— Estou fora dessa. Hoje sou uma exemplar dona de casa.
— Parabéns. Não sei se teria a capacidade de atingir tal nível.
— Vim por curiosidade. Queria ver o tal fenômeno Rosa de perto... E te rever, por que não? Sabe, até que eu quis te convidar para o casamento, mas naquela pressa, naquela loucura...
— Ei, tudo bem. Também queria me desculpar pela cena no bar. Acho que generalizei quando falei dos gaúchos. E toda generaliz...
— Sabia que não teria coragem de falar o que falou rodeado de gaúchos — disse Joel Breitner.
— Cometem-se muitas injustiças quando se generaliza. Na verdade, por aqui não se vêem tantos outros frescos como se pensa. Parece que tem um sujeito ali que não é. Ah, ele é catarinense. Vi a bandeira de Santa Catarina no gravador dele — disse Abel, já se retirando com o restante da equipe de campanha, que passava pelo local a caminho da saída. — Adeus, Paulinha.

quinta-feira, agosto 24, 2006

ARISTÓTELES SAI DO TÚMULO

Um apelo ao futuro presidente

Aristóteles Omorris

Serranópolis, Ohio - Depois de escrever estafantes quatro colunas durante a miserável Copa do Mundo naquele país horrendo - mas que com muita justiça e sabedoria me venera -, resolvi tirar merecidas férias. Peguei meu iate, o Tite Nanico, que ficou ancorado no rio Ariranha durante o mundial, e fui curtir a vida em lugares calmos e aprazíveis, como Faixa de Gaza, Líbano, Caxemira, Coréia do Norte, Chechênia, Afeganistão, Iraque e São Paulo.

Claro que o curto período de tempo não foi suficiente para repor minhas preciosas energias. Estava eu a travar um dos meus intermináveis, agradáveis e inteligentes colóquios com o bom ditador da Coréia do Norte - aquele baixinho do cabelo de capacete cujo nome não me lembro - quando o maquiavélico editor deste blog, cujo nome me recuso a pronunciar, obrigou-me a voltar ao trabalho. Bem na hora que o bom genocida iria me servir alguns acepipes de sua criação de bebês, que fica no quintal do palácio.

Mesmo violentando as leis trabalhistas, que me garantem, a cada ano, onze meses de férias e um de descanso, resolvi voltar ao (argh!) Brasil. Afinal, meus conceituados e elíticos leitores estavam tendo lancinantes crises de abstinência devido a minha ausência neste modorrento meio de comunicação.

De qualquer modo, deixo registrado meu protesto e - simultaneamente - um apelo ao próximo presidente (ou ao atual, caso reeleito): nós trabalhadores não agüentamos mais! Que se reduza essa carga horária desumana e cruel. Citando meu exemplo pessoal, enquanto paradigma do trabalhador brasileiro, não suporto mais a rotina de acordar de madrugada, às 13 horas, receber massagens de profissionais tailandesas somente às 16, ter de ir a restaurantes franceses às 20 e me recolher, empanturrado de caviar russo, às 2 ou 3 da manhã. Tende piedade de nós!

Aristóteles Omorris já foi condenado por prática ilegal de vigarice





Principal benefício
obtido pelo
então deputado
Aristóteles Omorris.
E não estamos falando
do tubo, mas do
que se encontra
abaixo dele

sábado, agosto 12, 2006

TRECHO DE "CESALPÍNIA"

Os novos donos do poder em Portugal não se conformavam com o desenvol­vimento alcançado por Bragança Nova. Lá não havia o trabalho gratuito (es­cravidão), não havia uma férrea disciplina a obrigar todos a trabalhar (tra­balhava-se, e muito, por livre e espontânea vontade) e, o que era mais grave aos olhos metropolitanos, não havia um português a comandar a região.
Para efeitos legais — os helenistas não viam razão para se submeter a uma autoridade, mas o governo geral exigia que alguém ocupasse a chefia da gestão —, o governo da capitania estava entregue a Suzanne Lima, o que cau­sou uma comoção geral no Rio de Janeiro e, pouco depois, em Lisboa. Onde já se viu uma mulher ocupar um cargo de alto relevo? Aceitavam-se, pelo mundo afora, monarcas do sexo feminino, desde que não reinassem muito. Mas eleger uma mulher comum, sem sangue real e, portanto, divino? Para os poderosos este fato se explicava pela ausência de religiosidade entre os bragantinos. Os religiosos países latinos davam um papel definido para a mulher e este não era o de trabalhar em pé de igualdade com os homens e muito menos o de governá-los.
Em 1781 resolveram promover uma “discreta” vingança contra toda a regi­ão. Em vez de invadir, destituir o governo e implantar o estilo luso de go­vernar, proibiu-se o intercâmbio comercial entre Bragança e o resto da colônia do Brasil. “Vosso povo provou ser deveras eficiente para desenvolver-se por si próprio”, dizia o despacho da secretaria de assuntos estrangeiros enviado a Suzanne. “Não mais é necessário que saiam produtos bragantinos da capitania nem que entrem produtos brasileiros, portugueses ou estrangeiros em Bragança Nova.”
Isolamento
Como nos anos seguintes as autoridades coloniais continuaram a detectar movimento de entrada e saída pela fronteira, Lisboa resolveu radicalizar. Criou uma base para um agrupamento militar ao sopé das serras pelas quais se chegava a Bragança Nova. Oficialmente seria uma base avançada do exército colonial com objetivos expansionistas: serviria de ponto de apoio para as tropas designadas para proteger as fronteiras oeste e norte do Brasil.
Os soldados tinham ordem de deter quem fosse apanhado aventurando-se pelo único caminho transitável que levava à cidade de Natália. E deviam ati­rar em quem tentasse forçar a entrada ou saída. Depois de alguns incidentes iniciais — houve cinco mortes e dezenas de prisões —, os bragantinos con­formaram-se com sua nova situação. Aqueles brasileiros ou estrangeiros que tinham negócios com a capitania procuraram outros mercados.
Os primeiros anos de total isolamento foram bem assimilados pelos bra­gantinos. Felizmente produziam tudo que era necessário para a subsistência, e era para o consumo interno que deviam voltar sua produção, sua economia dali em diante. Evidentemente tiveram de deixar de consumir alguns alimentos cujo cultivo era impossível na região. Mas nada desesperador. Viriam a sen­tir falta de alguns avanços tecnológicos dos países mais desenvolvidos, as­sim como o resto do mundo ficaria privado das descobertas e invenções da capitania.
Mas o que mais os bragantinos lamentavam era a perda do contato com o mundo, com o que acontecia, com o que se falava e escrevia pelo planeta. Acompanhavam com extremo interesse o processo de independência das colônias norte-americanas, liam avidamente notícias sobre a Revolução Industrial e recebiam exemplares de obras dos iluministas franceses. Lastimavam que Por­tugal estivesse na contramarcha da liberalização do mundo ocidental.
Diálogo
Cronista dos primeiros tempos do isolamento, Rodrigo Rocheteau Rabelo, de um dos ramos da heróica família Rabelo Lisboa, escreveu, em 1793: “Vive­mos na especulação do que está ocorrendo no mundo. Que terá acontecido às ex-colônias nortenses? Como está sendo o governo da Maria vingativa? É uma situação angustiante. Como se o convidassem para uma festa mas lhe trancas­sem num cômodo apertado e escuro de onde não se ouvia nem o burburinho das gentes. É degradante que corramos o risco de receber cumprimentos de chumbo se apenas colocarmos a cabeça por sobre os morros que nos cercam.”
Páginas adiante Rodrigo relata o que se falou numa reunião da qual to­mou parte: “Cambises Pereira nunca fora visto tão exaltado. Falava alto e gesticulava ao pedir que tomássemos uma decisão enérgica contra o estado de coisas. Queria que formássemos um exército para atacar a base militar. Cal­ma, Tina Fontes lembrou-o da escassez de armas em Bragança. Que as fabrique­mos, bradou Cambises. Júlio Piza argumentou que não tínhamos pólvora, acres­centando ainda que uma medida de força poderia resultar no extermínio de centenas de milhares de bragantinos. Disse que talvez fosse esse o pretexto pelo qual os lusos esperavam para acabar de vez com nossa incômoda existên­cia. Tina levantou-se e afirmou que a única alternativa viável seria tentar o diálogo, tentar um acordo com a metrópole.”
Novas reuniões foram marcadas. Propostas surgiam de quase todas as ci­dades. “Cada cidade votou numa proposta”, conta Rodrigo Rabelo. “As propos­tas vencedoras foram comparadas, muitas eram idênticas, e quatro delas foram colocadas à escolha de toda a população (...) No final ganhou a proposta que nomeava um negociador para ir ter com os portugueses com o objetivo de esta­belecer o mínimo contato entre Bragança Nova e o mundo.”
Aleg Zânder Gonzaga pode ser considerado uma espécie de protoconector da história da Cesalpínia. Foi ele o designado para conversar primeiro com o comandante da base militar. “Aleg Zânder estava tranqüilo”, escreveu Rodri­go. “Beijou seus pais, suas irmãs, recebeu a bandeira branca e partiu, deci­dido, de Natália para a direção do agrupamento luso. Ficamos nós, a multidão e eu, a acompanhá-lo até que víssemos somente o pano branco a tremular pouco acima da linha do horizonte. Ninguém falou nisso, mas temíamos ouvir, a qualquer momento, um tiro de espingarda disparado por um dos lusos soldados.” O tiro não foi disparado. A estratégia da bandeira funcionara: curio­sos, os militares resolveram receber Gonzaga. Em conversa reservada com o comandante da base, coronel Francisco Aguiar de Lima, o representante bra­gantino discorreu sobre as propostas de seu povo. O militar disse que não podia decidir nada a esse respeito, que tinha apenas suas ordens a cumprir, mas que levaria um relatório sobre o encontro ao seu superior quando fosse ao Rio de Janeiro.

domingo, agosto 06, 2006

INSANIDADE EM PÍLULAS

- Aqui não jaz um político honesto. Nem aqui nem na China.

- Político não sai de cena. Ele a rouba.

- Não o chame de canalha! Ele apenas tinha lapsos de honradez.

- Doutor, ainda tem uma pessoa no mundo falando que todo político é ladrão. O senhor esqueceu de comprá-la.

segunda-feira, julho 31, 2006

TRECHO DE "A CONFRARIA..."

Ao contrário da confirmação da explosão inicial, os famintos confrades não tiveram de esperar muito pelo almoço. Costa Jr. e Luft trouxeram uma grande variedade de pratos, embalados em papel laminado, para agradar todos os gostos. Sentados a uma mesa na sala da casa, Abel e Raful puderam enfim fazer um breve intercâmbio de frases. Mas, perto deles, outros também tive­ram a condenável idéia de conversar durante a refeição.
— Essas marmitex — disse Luft —, essa igualdade entre ricos e po­bres, todos comendo sem luxo algum, uns dentro de casa, outros fora (até um deputado entrou na dança) deve te deixar alegre, hein, Arão? Sente no ar um cheiro de comuna, de kibutz, é ou não é?
— Vejam só — disse Arão, dirigindo-se a Abel, Raful e outros circuns­tantes. — Eu passei uma temporada no PC do B durante meus primeiros anos de faculdade. Tudo bem, admito. Mas foi uma fase. Já passou. Não acho que devo ficar pagando por esse pecado a vida toda.
— Mas você tem amigos lá. Tem até parentes. O irmão dele é um empe­dernido líder estudantil comunista.
— Ele é jovem, vai mudar. Até o partido está mudando. O que não deve mudar nunca (nem poderia) é a defesa dos opri­midos, do povão, o combate à lógica grotiana.
— De Grotius? Aquele que disse que os que caíram na servidão de forma legítima devem ficar contentes com sua sorte?
— Exato. O mesmo Grotius que considerava o estado um corpo perfeito de pessoas livres reunidas para gozar pacificamente de seus direitos. Não é uma beleza de contradição? A sociedade perfeita para quem não deu o azar de nas­cer servo.
— Isso já é da fase contratualista, que culminou em Rousseau. Chamam a Idade Média de era das trevas, essas coisas, mas foi lá na Idade Média que Guillaume d’Ockham disse que o livre-arbítrio é o fundamento da sociedade.
— Muito bonito. Depois vem um Hobbes...
— Não fale em Hobbes perto de mim — sorriu Luft.
— Entendo a aversão que você deve ter a Hobbes, que achava que toda a infelicidade dos homens vem de não saberem a quem eles devem obedecer em sã consciência. Isso vai contra toda a sua pregação individualista. Você está mais para Leroy-Beaulieu, que denunciava o estado tutor universal, sua mega­lomania em querer intrometer-se nos progressos humanos. Não me lembro direi­to se foi ele quem disse que o estado não tem a obrigação de buscar, ou pro­curar, a felicidade universal. Se não foi, fica sendo.
— Tenho aversão a Hobbes e até a Rousseau, a quem Maritain acusava de querer forçar o povo a ser livre. Para Maritain, o povo é a própria substân­cia do corpo político. O povo está acima do estado, o povo não é para o es­tado, o estado é para o povo.
— Maravilha — Ironizou Arão, deixando o garfo no prato e aplaudindo. — O ideal seria isso aí. O chato é a distorção. Meus ex-camaradas bolchevi­ques se consideravam o povo no poder. “O estado para o povo”. Mas que povo? Havia um povo manso, cordeirinho: este merecia viver; o outro povo, que ousou reclamar das arbitrariedades cometidas pelo “estado popular”, este deveria ser (e foi) descartado.
— Não sei não, mas você é da corrente revisionista, não?
— Por que você não desiste, Bruno? Não sou de corrente alguma, já me desintoxiquei do partido. Agora, acho que vai ser bom para eles ser submeti­dos ao chicote da verdade.
— Então vocês, ou melhor, eles se reerguerão redimidos, purificados dos velhos erros. Mas será que continuarão autodenominando-se comunistas, socialistas? Pois uma revisão dos dogmas, uma atualização de objetivos, de práticas, pressupõe uma troca de filosofia política, ou não?
— Não, não. O sonho socialista permanece vivo.
— Ato falho, ato falho! Vocês ouviram. Ele encheu o peito para falar que o “sonho socialista permanece vivo” — Bruno imitou o amigo.
— Eu só repeti uma frase que eles usam. O partido apenas passaria a incorporar a democracia, a liberdade individual, a pluraridade política como aceitáveis.
— Entendo. Tamanho do estado, ingerência na economia, burocracia, esse tipo de coisa não será revisto. Só me faz lembrar Eric Weil, para quem as filosofias políticas se definem pela quantidade de administração que admi­tem.
— Mas não se preocupe, Bruno. Hoje em dia não existe nenhum saint-si­moniano entre eles. Embora meu irmão, por exemplo, respeite um dos inspira­dores do marxismo...
— Fonte de Marx e Engels, para ser mais exato.
–– Embora respeite o sonho utópico bem-intencionado de Saint-Simon, meu irmão acredita que ninguém dentro dos movimentos socialistas vá redigir uma cartilha para distribuir as tarefas de cada um na nova sociedade que virá.
–– O que mais gosto em Saint-Simon –– disse Luft –– é quando ele ordena que os artistas empreguem seus talentos para apai­xonar a sociedade geral pela melhora de sua sorte. É a anulação da persona­lidade em seu paroxismo; a supressão da vontade, da criatividade, da imagi­nação até. Ao ordenar que o artista faça isso, dessa ou daquela forma, o verdadeiro criador é o que está por trás, mandando, enquanto o artista deixa de ser artista.
— É verdade: “Seja otimista, senão...” — Arão passou o dedo indicador direito pelo pescoço.
— Se for para recorrer a utopias, fiquemos com um dos menos utópicos dos autores do passado: Adam Smith. Já vejo que torce o nariz, Arão. Não, ele não revela um sonho utópico. Mas depois de discorrer sobre suas idéias, como a de que o crescimento econômico deve ser buscado como um meio de me­lhorar as condições de vida de todos; que para garanti-lo as instituições devem ser responsáveis pela sociedade, o que significa que devem ser tão internacionais quanto as principais relações econômicas de uma sociedade; e que essas instituições devem ser constantemente revistas pelo legislador (ponto importante, quando muita gente por aqui vê como defeito as revisões que se fazem em nossas constituições, por exemplo). Por fim (agora chego ao que me propus), diz Smith que compete à filosofia da sociedade proporcionar ao legislador idéias que o orientem, suas utopias.
— Ou seja, o legislador está muito ocupado legislando, ele é um pro­fissional da legislatura, então ele deve pegar as utopias fora de si, não é isso?
— Alguém deve pegar as utopias e tirar o melhor proveito de cada uma delas.
— Exatamente o contrário do que prega o Sócrates de Platão. Smith sim­plesmente trabalha com uma certeza que em Platão ainda era dúvida.
— Isso: a impossibilidade do rei-filósofo.
— Um rei-filósofo como poderia ter sido Spinoza, que escreveu, com toda simplicidade, que a finalidade do estado é a liberdade.
— Que coisa linda... — suspirou Raful.
— Lindo, realmente lindo — disse Luft. — Bonito na teoria, mas na prática é como Freud considerou, isto é, que o estado proíbe ao indivíduo a prática de atos infratores não porque deseje aboli-los, mas sim porque quer monopolizá-los. Na verdade é como Pierre Clastres disse: a terra sem mal é a sociedade sem estado.
— A coisa linda a que me referia — disse Raful — é a cultura enci­clopédica de vocês dois, jovens. Essas coisas me emocionam.
Como podia esse homem ser um dos mais ativos membros daquele esquadrão da morte de luxo? Abel ainda não acreditava.
– Mas seria bom que vocês distribuíssem a bibliografia após suas discussões – arrematou o policial.

sábado, julho 29, 2006

FRASES PARA DEPOIS DAS FÉRIAS

- Considerava-se tão deslocado no mundo que acabou achando que era o amigo imaginário de alguém.

- Sua angústia era tão grande que começou a usar bomba atômica para matar o tempo.

- Nunca soube dizer não. Casou-se.

- Sempre teve os pés no chão. Agora os tem abaixo.

quinta-feira, julho 13, 2006

COPA DO MUNDO: CONCLUSÕES, DEDUÇÕES, COINCIDÊNCIAS, PLATITUDES E OUTRAS COISAS

• O quarto árbitro que dedurou a cabeçada de Zidane em Materazzi era o espanhol Luis Medina Cantalejo, que garante ter visto o bizarro lance ao vivo. A Fifa proíbe o uso de recursos visuais eletrônicos para em decisões de arbitragem. Se Cantalejo dissesse que tinha visto a agressão em um monitor de TV qualquer e depois comunicado o fato ao juiz argentino, ele certamente seria punido pela entidade máxima do futebol mundial. O que importa é que sua interferência pode ter influenciado o resultado do jogo e da Copa, pois a França era claramente melhor que a Itália desde o início do segundo tempo. Zizou foi expulso no início da segunda parte da prorrogação.

• Luiz Medina Cantalejo foi o árbitro da partida que classificou a Itália para as quartas-de-final. Pelas oitavas, o jogo estava duro. Um zero a zero que parecia para sempre, pois era um encontro de duas equipes retranqueiras. Materazzi havia sido expulso e Buffon trabalhava mais que o goleiro australiano. Mas aos 47, ou seja, já nos acréscimos do segundo tempo, o lateral-esquerdo Grosso se jogou na área. Cantalejo não pestanejou. Decidiu que era pênalti. Totti bateu, fez o gol da classificação e colocou estranhamente o polegar na boca. Foi a primeira atuação "heróica" de Grosso no mundial, mas muito bem coadjuvado pelo sempre providencial Cantalejo.

• Os italianos já haviam sido beneficiados por decisões equivocadas da arbitragem em sua estréia na Copa. No jogo em que perdeu de 2 a 0 para a Itália, a seleção de Gana teve dois pênaltis claros não marcados pelo brasileiro Carlos Eugênio Simon. Parece que estava todo mundo de consciência pesada por causa dos erros que prejudicaram a Azzurra no mundial anterior.

• Os europeus em geral têm que aproveitar muito bem os próximos quatro anos, pois, levando-se em consideração o retrospecto histórico, eles não verão alguma de suas seleções levantar a taça Fifa por um bom tempo. Explico: nenhuma seleção européia ganhou a Copa quando esta foi disputada fora da Europa. Em 1930, no Uruguai, deu Uruguai; 1950, no Brasil, os uruguaios venceram novamente; 1962, no Chile, deu Brasil; 1970, no México, Seleção Brasileira outra vez; 1978, na Argentina, taça pra eles; 1986, no México de novo, agora com vitória argentina; 1994, nos Estados Unidos, tetra do Brasil, e em 2002, na Coréia do Sul e no Japão, deu Família Scolari. Como a Fifa adotou o rodízio de continentes para definir as sedes dos mundiais, a próxima Copa na Europa deverá ser realizada somente em 2030. Em 2010 será na África; 2014, América do Sul (provavelmente Brasil); 2018, Oceania; 2022, Américas Central, do Norte e Caribe, e 2026, Ásia. Como o Uruguai está morto e o Brasil ganha mais mundiais que a Argentina, é provável que, quando a Copa estiver de volta à Europa, a Seleção Brasileira já seja ênea ou decampeã.

• Moto perpétuo: México e Espanha mais uma vez chegaram cheios de planos, botando banca e parecendo gente grande. Foram embora mais cedo. Como sempre. Eternos cavalos paraguaios das copas, eles têm que se conformar com o papel de figurante tenazmente exercido por Suécia, Polônia, Suíça, Paraguai, Estados Unidos, Escócia, Bulgária, Áustria, Bélgica, Rússia e várias outras que também costumam faltar a alguns mundiais, mas logo estão de volta para servir para aumentar ou diminuir o saldo de gols dos favoritos. Mas outras equipes metidas a grande também não podem falar muito grosso não. Afinal, Inglaterra e Holanda há muito tempo chegam às copas credenciadas, cheias de "estrelas", mas no fim sempre sucumbem. Falta aquele algo mais - que a França parece ter encontrado - para atingir o patamar em que se encontram Brasil, Itália, Alemanha e Argentina.

sexta-feira, julho 07, 2006

ARISTÓTELES OMORRIS

A Copa é um tédio

Aristóteles Omorris

Berlim, o velho ranzinza que teve seu muro demolido. Bem feito - Por mim, não escreveria nada. Odeio futebol e fui obrigado a interromper minhas férias na Côte d’Azur, Suécia, para vir cobrir este torneiozinho. Gostaria de ficar apenas de papo pro ar e saboreando a rica e suína culinária alemo-germânica. Mas o imbecil-mor deste planeta, o editor deste blog, ameaçou não depositar o último milhão de dólares em minha conta em um banco suíço ali das Bahamas.

Assim, pautado exclusivamente pela ética e pela boa vontade, submeto-me ao sacrifício de escrever sobre a (bleargh!) Copa do Mundo da Alemanha 2006 (como se houvesse uma Alemanha 2001, 1998, 1568, 1354 etc. e dízima periódica. Bah!).

Frâncios e itálicos, me contaram - mediante suborno -, estão na final do mundial. Grande coisa! Em minha juventude (que não faz muito tempo, embora os detratores, mais uma vez liderados pelo perverso FC, divulguem aos três ventos - o quarto está internado - que fui babá daquele jovem que bradou retumbantemente “independência ou morte!”. Mentira! E calúnia ainda por cima! Eu sou jovem. Podem perguntar ao Sigmund, menino cujas fraldas trocava, compadecido pela preguiça da senhora Freud), fui semifinalista do torneio de palitinho de um respeitável estabelecimento de uma cosmopolita cidade chamada Serranópolis, o Boteco do Tonhão.

Fui semifinalista e ninguém falou nada! Tudo bem que perdi (roubado) a semifinal para o grande jogador Ceguinho da Igreja, mas a imprensa mundial ignorou a competição de uma forma que nos fez, à época, suspeitar de uma conspiração da Federação Internacional de Jogos que Envolvem Palitos com seu maior patrocinador. Senão vejamos: Ceguinho da Igreja usava camiseta da campanha para vereador de Zezinho da Nair. O cunhado de Zezinho da Nair era freguês inveterado da vendinha do senhor Adavilson, que era justamente o patrocinador da federação. Afinal, o “ilustre” empresário fornecia palitos à nebulosa entidade...

Neste ponto alguém pode perguntar: o que uma coisa tem a ver com a outra? Como e por que propósito a Federação Internacional de Jogos que Envolvem Palitos, aliada ao senhor Adavilson e, quiçá, a Zezinho da Nair, sabotaria, por meio da compra do silêncio da imprensa de todo o mundo, a própria competição que promovia? A resposta é simples: não sei.

De que estávamos falando mesmo, antes desta digressão passado-nostálgica? Ah, sim: da final do torneio fubeca da Alemanha. Bem que eu queria analisar as táticas de ambas e eurôpas seleções, falar de jogadores, técnicos, estatísticas e história. Mas meu espaço acabou. Meu néscio editor disse que era para escrever no máximo o número de linhas que este artigo possui. Se não falei do joguinho de domingo, a culpa é dele, que não me deu mais espaço. Ahahahahahah!!! Taí, maldito! Toma teu texto! Caíste em tua própria armadilha! Agora me deixe em paz, pois voltarei ao meu merecido ócio e à degustação dos milhares de variedades de salsichas. Pro inferno com a Copa!

Aristóteles Omorris é colunista esporádico e schwudel em tempo integral


Primeira - e única
prova de automobilismo
disputada pelo ex-piloto
Aristóteles Omorris, que não
aparece na foto pois a esta
altura da corrida estava
quatro voltas atrás do
primeiro pelotão (formado por
todos os outros pilotos)

domingo, julho 02, 2006

AS DESCULPAS DA BOLA DE CRISTAL

Minha bola de cristal continuou esfumaçada e confundindo meus olhos. Acertei quase todas as quartas-de-final e, de acordo com a revisão das previsões iniciais, acabei só errando um dos semifinalistas. É que eu tinha cravado Brasil em vez da França...

Aliás, foram os franceses que causaram um curto na bola. Eles não tinham nada que terminar em segundo lugar em um grupo em que tinham como companhia Suíça, Coréia do Sul e Togo. Se tivessem feito o dever de casa, teriam terminado na liderança e enfrentado a segunda colocada do grupo H, a galinha-morta Ucrânia. O time de Zidane passaria fácil e enfrentaria a Itália nas quartas. Elas que se matassem pra ver quem perderia para a Alemanha.

Enquanto isso, o Brasil teria se defrontado com a Espanha em Frankfurt, pois a "Fúria" não amarelaria diante da Suíça nas oitavas. Mas, vendo uma legião de camisas amarelas pela frente, os espanhóis evidentemente travariam, como o fizeram no encontro com a França, e a Seleção de Parreira, mesmo apática e desinteressada, teria carimbado o passaporte para disputar com Felipão uma vaga na final.

Viu só? Foi a França que bagunçou minha bola de cristal! Deve ter o dedo do Nostradamus nessa história toda...

UMA COPA JOGADA NO LIXO

O elenco mais caro do planeta, as maiores estrelas, o maior número de titulares nos clubes mais importantes da Europa. Tudo isso e muito mais o técnico da Seleção Brasileira, Carlos Alberto Parreira, tinha em mãos. Mesmo assim ele conseguiu ser eliminado nas quartas-de-final da Copa do Mundo, ao perder para a França por 1 a 0 no sábado (1º/7), em Frankfurt, na Alemanha.

Evidentemente faltou vontade a alguns jogadores, especialmente aos mais badalados, com especial destaque para Ronaldinho Gaúcho e Roberto Carlos - o que é um absurdo, pois, se um jogador não se enche de determinação para disputar uma Copa, tê-la-á para quê? Sim, faltou vontade, mas competia ao treinador remover da equipe titular os integrantes do MSP (Movimento dos Sem-Paixão).

Cafu, Adriano, Ronaldo, Emerson e Kaká até que demonstraram alguma vontade, mas não estavam em suas melhores condições físicas e/ou técnicas. Também caberia a Parreira deixar no time somente aqueles dentre estes que pudessem ser úteis à Seleção.

Não estava tão difícil chegar ao hexacampeonato. Se o Brasil tivesse jogado desde o início com um time determinado e forte física e mentalmente, não teria dificuldades para bater a França e depois, nas semifinais, o time de Portugal, liderado pelo aguerrido e passional Luiz Felipe Scolari. Na final, contra os entusiasmados donos da casa ou os insidiosos italianos, tudo poderia acontecer.

Mas Parreira - principalmente ele - “optou” por jogar fora a possibilidade do título. Sem coragem ou personalidade para tirar do time jogadores que não eram apenas seus comandados, mas também seus amigos (alguns de longa data), o treinador preferiu tornar-se um torcedor. Passou a torcer para que o talento individual aparecesse de uma hora para outra e que, a qualquer momento, decidisse as partidas.

Funcionou contra times mais fracos. Foi difícil, o Brasil sofreu, mas passamos por Croácia, Austrália e Gana. Foi tranqüilo somente diante do Japão, “coincidentemente” no dia em que Parreira decidiu poupar Cafu, Roberto Carlos, Emerson, Zé Roberto e Adriano.

Sim, o time japonês, dirigido por Zico, marca mal e precisava vencer por boa diferença de gols, o que facilitou o trabalho brasileiro. Mas foi possível perceber que Cicinho, Gilberto, Gilberto Silva, Juninho Pernambucano e Robinho estavam num momento melhor que o dos titulares. À exceção de Zé Roberto.

No entanto, na partida seguinte, lá estavam de volta os integrantes do MSP. A vitória veio, devido à incompetência de Gana, o que deu a Parreira a ilusão de que o time dos seus chegados poderia passar pela França, que havia feito uma sofrível primeira fase. Uma alteração deu um certo alento a muita gente: saiu Adriano e entrou Juninho, com Ronaldinho Gaúcho sendo passado para o ataque, onde ele joga no Barcelona.

O problema é que os laterais não foram trocados. O esquema tático brasileiro, para funcionar, precisa de laterais com vigor e qualidade para defender e atacar o tempo todo, que façam ultrapassagens e que vão à linha de fundo sempre. Foi assim contra o Japão. Foi assim que o Brasil encantou o mundo nos dois jogos finais da Copa das Confederações no ano passado. Naquela ocasião os laterais também eram Cicinho e Gilberto.

Desse modo, o time, mesmo com Juninho e sem Adriano, não funcionou. No intervalo, se quisesse continuar na Copa, Parreira deveria ter trocado os dois laterais e colocado Robinho no lugar de um dos apáticos (e não galácticos): Kaká ou Ronaldinho Gaúcho. Mas ele só foi fazer uma mudança depois dos 15 minutos da segunda etapa. Pior: mexeu errado. Colocou Adriano no lugar de Juninho e voltou a uma formação que não vinha funcionando!

Queimada uma substituição, ele poderia fazer mais duas. Mas resolveu alterar novamente o time só depois dos 30! Tirou Cafu e colocou Cicinho, trocou Kaká por Robinho. A equipe ficou mais rápida, incisiva e criou nos minutos finais o que não tinha criado por muito mais de uma hora. Mesmo com o peso morto de Adriano em campo. Mas era tarde demais. O título já estava na lata de lixo.

Foi apenas a culminância de uma sucessão de erros perpetrados por um Parreira que parece ter perdido o pulso de 1994. Quem viu os treinos da Seleção na Suíça e na Alemanha sabe que o treinador não mostrou muita disposição pelo trabalho, não ensaiou jogadas, não experimentou alternativas táticas e não conseguiu com que a maioria dos jogadores percebesse que o que estava em jogo era uma Copa do Mundo e não uma pelada entre casados e solteiros.

quinta-feira, junho 29, 2006

NOVOS TRECHOS DE "A CONFRARIA DOS HOMENS DE BEM"

Já no estacionamento Abel realizou o ritual que já se tornava um hábi­to. Discretamente tentava detectar atitudes e veículos suspeitos pelas ime­diações. Viu apenas o pipoqueiro e o vendedor de algodão doce, na verdade agentes de segurança disfarçados contratados por Sforza. Foi-lhes dito que o editor da Proeza vinha sofrendo ameaças e que precisava de uma vigilante proteção. Do outro lado do estacionamento um Tempra branco esperava que Abel saísse para que logo em seguida o escoltasse, procedimento do qual ele já estava a par. Podia partir tranqüilo e colocar-se à espera do deputado, um tipo de ídolo dos confrades, ou então o eleito entre eles para alcançar por outros meios aquilo que eles conseguiam pela remoção de “entraves que impedi­am que a sociedade alcançasse a harmonia e o bem-estar em sua plenitude”.

Pensavam que ele precisava ouvir as palavras de Rosa para finalmente abraçar a causa dos homens de bem. Será que eles não percebiam que ele já pouco se importava se eles matavam suas vítimas por enforcamento ou inani­ção? Que ele já aceitara o que lhe acontecera como natural e inevitável? Os últimos meses ensinaram-lhe a ser mais pragmático. Um tanto quanto cínico ele já era. Agora ele dizia a si mesmo que não adiantava continuar a sentir remorsos ou culpa. O que ele poderia fazer? O sangue não deixaria de impreg­nar suas mãos em hipótese alguma. Se denunciasse a Confraria, poderia ganhar proteção da polícia enquanto assistia às investigações sobre as atividades dos confrades. Proteção? Eles prometeram que não lhe infligiriam nenhum dano físico. Enfim, conseguiriam provar alguma coisa contra eles, contra conspi­radores tão eficientes e meticulosos? Se eles fossem presos, se a Confraria fosse desmantelada, os estranhos e fatais incidentes cessariam, mas os atos inescrupulosos daqueles ligados à administração e à representação públicas continuariam a causar sérios problemas aos menos favorecidos. Eles sujaram suas mãos para sempre ao travarem com ele o primeiro contato.

Melhor permanecer do lado mais justo. Ou menos injusto. Tanto melhor que conseguiu um bom emprego, um salário invejável e a vida que teria pedido a Deus se acreditasse em um. Que importava se estava convencido ou não da justeza dos atos da Confraria? Não estava minimamente disposto a abrir mão do que conquistara; não apearia do cavalo da fortuna. Conversaria normalmen­te com o deputado. Mas nada do que lhe fosse dito alteraria seu pensamento. Estava sinceramente curioso a respeito das idéias daquele homem. E do próprio homem. Queria saber detalhes de seu projeto. Sentia-se privilegiado por vislumbrar o embrião de uma candidatura à presidência da República. Um con­frade-presidente. Idéia impensável, de difícil digestão.

***

Raful sorriu de forma complacente. Os outros confrades também não se livraram de seus sorrisos. Alguns trocaram curtas e cochichadas palavras.
— Mas, Abel... — disse o delegado. — Ao participar deste projeto estou... hã... exercendo minha profissão com mais eficiência. Minha função é proteger e servir a sociedade. E é exatamente o que a Confraria também faz. Removendo alguns elementos daninhos, estou... estou realizando uma... profi­laxia. Isso. Uma profilaxia contra as doenças que afligem a sociedade. Pro­tejo-a contra seus parasitas e sirvo-a através... através da minha total entrega a este projeto que só... hã... objetiva o bem comum. Toco meu violão com a mais tranqüila das consciências.
— Não há como argumentar com vocês... — disse, lançando o olhar em volta. — E esta palhaçada toda, o que foi? Um teste? Vocês sabiam de minha relação com Raful. Sabiam o tempo todo. Então resolveram testar minha leal­dade. E eu fui lá investigar, dócil e obediente como um cachorrinho. Eu fa­lhei como amigo, mas vocês ficaram exultantes com isso, pois era o que que­riam que eu fizesse. E então? Como me saí?
— Muito bem — disse Rosenfeld. — Fez o que se espera que faça um homem de bem. Acima das amizades está o bem comum. Você não pode apoiar al­guém que nada no erro por esse alguém ser seu amigo, um amigo que prejudica a grande maioria. O homem de bem pensa mais alto.
— Você foi aprovado — afirmou Benício.
— Parabéns — disse Silvano, apertando a mão de Abel. — Parabéns, confrade Abel.
Subitamente toda a sua cor esvaíra-se. Sentia um frio glacial percor­rer-lhe o corpo de e para todas as direções. “Confrade Abel”? Um teste. Como aquele pelo qual Bruno Luft passara. Mas o rapaz queria tornar-se um confra­de. Abel não desejava tal honra. Esquadrão da morte de luxo... Mas, olhando as coisas de outro ângulo, ser membro da Confraria significava que eles ti­nham total confiança nele. Significava estar no poder, ser o poder, caso vingasse o projeto político. Significava também a substituição da omissão pela cumplicidade em relação aos crimes nascidos naquelas reuniões. Mas ele já estava preso de corpo inteiro naquele sinistro emaranhado. Seu destino não seria tão diferente do dos outros na hipótese de a conspiração ser um dia descoberta. Sim, que mal havia em ser tratado de confrade? Afinal, nada mais mudaria em sua vida. Ele apenas passaria a ser tratado por um título, uma mera palavra, não era isso? Com a vantagem de usufruir os privilégios que o poder costuma oferecer.
— Confrade Abel... — divagou o jornalista. — Não soa tão mal.
A partir daquele momento teve de enfrentar uma demorada sessão de abra­ços e apertos de mão. Todos queriam saudar e dizer parabéns ao novo irmão. Uns de maneira mais efusiva que os outros. Bruno Luft cometeu o exagero de um beijo na face esquerda.
— Valeu, Abelão, meu velho. Se não pudemos ser cunhados, agora somos bem mais que isso. Somos confrades, logo irmãos.
— E que não passe disso — disse Abel, esfregando o rosto.

***

Caso alguém - certamente vítima de insanidade temporária (ou definitiva) - tenha vontade de ler a obra completa, há diferentes meios de se atingir tal objetivo:

À direita há um link para o site da Papel & Virtual Editora, bem na página em que o livro está à venda.

Caso queira receber por e-mail, em PDF, há uma taxinha simbólica de R$ 5,00. Eu mesmo mando o livro para seu endereço eletrônico.

Meu e-mail é franciscocabral@gmail.com

domingo, junho 25, 2006

DIGRESSÕES SOBRE A COPA

- Terminada metade dos jogos das oitavas-de-final, tive 100% de acerto sobre quem passaria para as quartas, embora os adversários de alguns dos classificados tenham sido outros em minhas previsões.

- Achei que o Brasil enfrentaria a República Tcheca (do meu amigo de Praga), mas os tchecos simplesmente apagaram no confronto com Gana. Parece que pesou a falta de intercâmbio com times de fora da Europa, onde os conterrâneos de Kafka vem causando furor há mais de uma década.

- A Seleção Brasileira vai passar sem sustos por Gana. Terá um jogo dificílimo com a Espanha, mas vai passar relativamente fácil pela semifinal com Portugal. Ou seja, mudei minha previsão. Inicialmente, segundo minha bola de cristal, seria a Inglaterra a disputar com o Brasil uma vaga na final. Mas os ingleses estão jogando mal e sem raça. O time de Felipão vai bem pelo menos no segundo quesito.

- Hoje também já não tenho certeza da presença argentina na decisão. No jogo com o México, nossos bons vizinhos não mostraram a determinação habitual. Nem encaixaram seu vistoso toque de bola. A Alemanha, ao contrário, é uma máquina mais azeitada a cada dia. Os jogadores, desde a primeira partida, estão completamente impregnados do espírito rodrigueano da "pátria em chuteiras". E estão jogando como nunca. Até o Klose, que era uma espécie de Obina branco, está se revelando um Tostão, um Careca... Bem, na verdade, um Klinsmann - que é o atual chefe dele.

- Em suma, a bola de cristal, de pilha nova, mas esfumaçada, ainda parece mostrar calções negros e camisas brancas na final. Mas sem listras azuis desbotadas.

- Se dependesse só dos técnicos, o Brasil não teria nenhuma chance diante de Portugal.

LITERATURA: UM ESCRITOR INJUSTAMENTE DESCONHECIDO

“Desconhecido” em termos. O grande público de hoje pode jamais ter ouvido ou lido o nome Gilbert Keith Chesterton. Ou G.K. Chesterton, como também era conhecido. Mas em sua época ele foi quase um Dickens, para ficar numa comparação entre ingleses.

Antes de tudo sua narrativa era deliciosa. Na verdade, ainda é, pois a obra é imortal. Felizmente. Seus textos são impregnados de humor, como forte pendor para a ironia e o sarcasmo. Como brinde, recebemos generosas pitadas de erudição.

Para os mais jovens, especialmente os aficcionados pelos quadrinhos adultos, um bom incentivo para a leitura de Chesterton é o fato de ele ter sido citado em uma das histórias de Sandman, de Neil Gaiman. Numa das cenas de uma das primeiras edições da célebre revista, na Biblioteca das Obras que Nunca Foram Escritas, aparece em uma estante um exemplar de “O Homem que era outubro”, de G. K. Chesterton. Uma alusão ao livro - este, sim, escrito e publicado - “O Homem que era quinta-feira”.

Para quem já conhecia o livro, não foi uma surpresa a citação-homenagem de Gaiman. Afinal, a trama da obra tem muito a ver com enredos de sonhos, o material de que vive Sandman, ou Morpheus, o Mestre do Sonhar.

O ambiente onírico, aliás, remete a outro autor espetacular, Franz Kafka. E a leitura dessa gente toda, desconfio, deve ter influenciado o tecedor destas linhas, cuja obra também apresenta um ou outro componente de sonhos. De uma coisa tenho certeza: o próprio estilo dos meus sonhos (e pesadelos) influenciou minha escrita.

Mas estou aqui é para dar esta dica: leiam Chesterton. Além do livro acima citado, seria bom também não deixar de lado toda a série de contos do Padre Brown, um detetive que não deve nada a Sherlock Holmes. Com a vantagem de contar com a escrita mais refinada do velho G.K. Ah, tem ainda os ensaios.

Confira abaixo uma pequena biografia do grande escritor:

GILBERT KEITH CHESTERTON

Prolífico crítico inglês e autor de versos, ensaios, novelas e de curtas histórias. Chesterton foi, com George Bernard Shaw, Hilaire Belloc, e H.G. Wells, parte dos grandes homens edwardianos das letras. Ele é, provavelmente, mais conhecido por sua série sobre o padre-detetive Father Brown, que apareceu em 50 histórias. Entre 1900 e 1936, Chesterton publicou uns cem livros.

"A grande massa da humanidade, com sua grande massa de livros vazios e de palavras sem valor, nunca duvidou e nunca duvidará que a coragem é esplêndida, que a fidelidade é nobre, que as donzelas em apuros devem ser salvas, e que inimigos vencidos devem ser poupados. Há um grande número de pessoas cultas que duvidam destas máximas da vida diária, justo, existe um grande número pessoas que acreditam que são o Príncipe de Gales; e eu tenho dito que ambas as classes de pessoas são agradáveis de se conversar." (de 'Uma defesa da moeda de um centavo Dreadfuls', 1901).

G.K. Chesterton nasceu em Londres-Inglaterra, no dia 29 de maio de 1874, numa família de classe média. Não aprendeu a ler até os oito anos e um de seus professores disse a seu respeito: "se nós abríssemos sua cabeça, nós não devemos encontrar o cérebro, mas somente uma protuberância da gordura branca." Chesterton estudou na University College e na Escola Slade de Arte (1893-96). Por volta de 1893, atravessou uma crise de ceticismo e depressão, e durante este período, Chesterton experimentou práticas de Ouija e cresceu fascinado com as artes mágicas. - Em 1895, Chesterton deixou a University College sem ter colado grau e trabalhou em Londres para o editor Redway, e T. Fisher Unwin (1896-1902).

Muitos de seus trabahos foram publicados, em primeira mão, por veículos como The Speaker, Daily News, Illustrated London News, Eye Witness, New Witness e em seu próprio semanário de G.K.'s Weekly. Chesterton renovou sua fé cristã; também o namoro com sua futura esposa, Frances Blogg, com quem casou em 1901, ajudou-o a sair da crise espiritual.

Em 1900, apareceu GREYBEARDS AT PLAY, a primeira coleção dos poemas de Chesterton. ROBERT BROWNING (1903) e CHARLES DICKENS (1906), eram os literatos biografos. THE MAPOLEON OF NOTTING HILL (1904), foi a primeira novela de Chesterton, uma fantasia política, na qual Londres é vista como uma cidade de ocultos contos de fadas (mentiras) cintilantes, e no THE MAN WHO WAS THURSDAY (O Homem que era quinta-feira, 1908) Chesterton retrata a decadência do final do século. O protagonista, Syme, é um poeta que se tornou empregado da Scotland Yard, e que revela uma vasta conspiração contra a civilização. Os membros do grupo secreto anarquista são nomeados por dias da semana. Sunday (Domingo) é o de caráter mais misterioso, que diz que, desde "o começo do mundo, todos os homens caçavam-me como um lobo - reis e sábios, poetas e donos da lei, todas as igrejas e todos os filósofos. Mas eu nunca fui capturado." Uma adaptação para o teatro da história, pela Sra. Cecil Chesterton e Ralph Neale, foi produzida em 1926.

Em 1909 Chesterton mudou-se com sua esposa para Beaconsfield, uma vila 25 milhas ao oeste de Londres, e continuou a escrever, a fazer conferências e a viajar com bastante energia. Entre 1913 e 1914, Chesterton foi um contribuinte regular do Daily Herald. Em 1914, sofreu problemas físicos e nervosos. Depois da Primeira Grande Guerra, Chesterton tornou-se líder do movimento Distributist, e mais tarde o presidente do Distributist League, promovendo a idéia de que a propriedade privada deveria ser dividida em propriedades menores e então ser distribuída por toda a sociedade. Em seus escritos, Chesterton expressou também a sua desconfiança nos governos do mundo e no progresso evolucionário, sua visão era, freqüentemente, ruralista, antimodernista e vitoriana. Ele também foi um locutor de rádio muito popular, cativando em uma série de debates com George Bernard Shaw. Seu irmão mais novo, Cecil, morreu em 1918, e Chesterton editou para seu irmão a 'New Witness' (Nova Testemunha) e seu próprio semanário, o 'G.K.'s Weekly'.

Observou Chesterton, ao ver pela primeira vez as luzes brilhantes e cintilantes da Broadway: "Como seria bonita para alguém que não pudesse ler." (The Wordsworth Book of Literary Anecdotes by Robert Hendrickson, 1990)

Em 1922, Chesterton converteu-se do Anglicanismo para o Catolicismo Romano, e depois disso escreveu a diversos trabalhos orientados à teologia, incluindo as Vidas de Francisco de Assis e de Tomás de Aquino. Chesterton foi agraciado com graus honoríficos de Edimburgo, de Dublin e da universidade de Notre Dame. Em 1934, ele tornou-se Knight Commander with Star (Comandante dos Cavaleiros da Estrela), ordem de São Gregório, o grande.

Chesterton morreu em 14 de Junho de 1936, em sua residência, em Beaconsfield. Seu caixão, demasiado grande para ser carregado escadaria abaixo, teve que ser abaixado da janela à terra. Dorothy Collins, secretária de Chesterton, gerenciou seu acervo literário até sua morte, em 1988.