terça-feira, maio 29, 2007

CONSTATAÇÃO INEVITÁVEL

No quarto século antes de Cristo, Aristóteles de Samos, legítimo sucessor de Sócrates e Platão no topo do ranking da filosofia de sua época - e preceptor de um certo Alexandre, então príncipe da Macedônia -, escreveu que o homem é um animal político.

Vivesse nos dias atuais, o ídolo de Tomás de Aquino talvez dissesse que alguns políticos são uns animais.

sexta-feira, maio 25, 2007

'OTORIDADES' ESTÃO DESCONTROLADAS

Talvez experimentando um pavor inédito em suas vidas, nossos políticos e magistrados agora resolvem direcionar sua ira contra a Polícia Federal. Animais acuados mostram os dentes, todos sabemos.

Nossas "otoridades" agoram querem punir policiais ou promotores que venham a vazar informações sobre inquéritos ou que promovam atos e prisões "abusivos". Seria ato falho pedir a cabeça dos que investigam em vez de pensar em meios para acabar com os fatos que geram tais investigações?

A reação dos poderosos dos três poderes (assim mesmo, com redundância) me faz mais uma vez dar razão a George Lucas, que, por meio do bom e velho mestre Yoda, disse que o medo leva ao ódio e o ódio, ao lado negro. No caso dos corruptos, que já têm residência fixa no lado negro, a reação raivosa já lhes é peculiar e é o que deles se espera.

"Otoridades", não se desesperem. Vocês agora só estão se sentindo como a classe média nacional, que tem medo de sair de casa, que teme pelos filhos, que transformou suas moradas em fortalezas, que, enfim, perdeu o direito de ir e vir.

Caros poderosos, agora vocês sabem como o povo se sente, especialmente os mais pobres, que vivem situação precária, que são obrigados a conviver com traficantes em favelas, que têm medo da polícia, que bate ou mata primeiro para perguntar depois, especialmente se o abordado for pardo ou negro.

A diferença é que, da classe média para baixo, a população não tem poder para alterar leis em benefício próprio.

quinta-feira, maio 24, 2007

PRATÃO, PIPÓCRATES E A GRANA



- Velho Pratão, sabia que o serviço secreto português foi extinto?
- Sabia não. Por quê?
- Não só o serviço secreto, mas também todas as agências de inteligência.
- Logo vi! Tu sabe que não gosto de piadas de português!
- Calma, bicho...
- Aliás, não gosto de nenhum tipo de piada étnica, racial, religiosa ou de humor negro.
- Então tu não gosta mesmo é de piada, né não?
- Vai...
- Deixa eu completar a piada: diz que o motivo é a alta taxa de mortalidade dos agentes lusitanos. É impossível repor tanta gente em tão pouco tempo.
- ...
- “Por quê?”, você pergunta. Calma, eu respondo: “É a lei, ó pá! Nós agentes portugueses somos obrigados a nos identificar aos alvos de nossa investigação”.
- Estou morrendo de rir.
- “Muito, prazer, senhor traficante. Meu nome é Manoel Joaquim de Oliveira. Sou o agente da inteligência designado para me infiltrar sorrateiramente em vossa quadrilha com o fito de obter informações que venham a levar o senhor e seus comparsas para a prisão”.
- ...
- “E meu nome falso é Joaquim Manoel de Oliveira. Favoire chamar-me por esse codinome”.
- ...
- Tu é um pé no saco, sabia? Vou ali jogar na Megasena...
- Escravo da natureza!
- O quê? Quêqui tu falou?
- Tudo que tu faz é obedecer cegamente à natureza. Como se não tivesse vontade própria.
- Ah, não! Ah, não! De novo aquela merda? Porra, não posso nem fazer minha fezinha mais? Quêqui tem a ver apostar na loteria com ser escravo da natureza?
- Tudo, meu caro. Tudo.
- Então fala. Já contei minha piada. Agora conta a sua.
- Veja bem: pra que você joga na loteria?
- Pra ganhar muito dinheiro.
- Pra quê?
- Pra dar uma vida melhor pra minha família, pra parar de trabalhar pros outros, comprar uma casa melhor, um carro melhor, viajar...
- Isso é o que você diz a si mesmo para tentar esconder o fato de que está apenas agindo por instinto, ou seja, sob ordens da natureza.
- Ah, vai...
- Calma, camaradinha. Sua vida já é boa: você e sua família vivem bem, seus filhos nunca passaram necessidades, muita gente sonha com seu emprego, sua casa é confortável, seu carro te leva pra onde tu quer e tu pode viajar de vez em quando (aliás, quem agüenta viver viajando?). Então pra que tu quer mais?
- Então todo mundo é obrigado a se conformar com o que tem, com o que é, só pra não ser escravo da natureza? Tenha a santa paciência!
- Eu não disse que todos devem se conformar. Só quero falar dos mecanismos que a natureza paciente e minuciosamente aperfeiçoou ao longo da evolução das espécies para que hoje, nesta ensolarada tarde, meu amigo Pipócrates tivesse o impulso de ir fazer sua fezinha. Não estou dizendo que Vossa Augusta Insolência está agindo de forma equivocada.
- Então que o nobre FDP faça uma instrutiva explanação.
- Obrigado. Então vamos lá: o grande lance da natureza é fazer com as espécies coloquem no topo de suas respectivas listas de prioridades a própria reprodução, sua perpetuação. Para que isso aconteça implantou nos seres uma irresistível compulsão pela cópula. Mais fortes fisicamente na maior parte do reino animal, os machos passaram a reivindicar o controle sobre o maior número de fêmeas possível ou aquelas mais apropriadas para a reprodução. Entre os seres humanos e outros bichos, as fêmeas também podem aceitar ou rejeitar parceiros. E elas, por motivos evolutivos, preferem aqueles que teriam melhores condições de sustentar a parceira (ou parceiras) e sua prole com maior eficiência. Sabendo disso, os homens sempre procuraram se apresentar como os mais fortes, os mais capazes, mais competentes na caça, na pesca. Daí surgiu a luta pelo poder. Quem conseguisse liderar a caverna poderia ter a mulher que desejasse. O mais capaz, o líder, também era o mais desejado pelo sexo oposto.
- E o que isso tem a ver com minha loteria?
- Ora, velho amigo... Como se obtém poder hoje em dia? Pelo dinheiro e pela política. Ou pelos dois ao mesmo tempo. E um leva à outra e vice-versa. Por que tanta ganância, tanta cobiça, tanta ânsia por ter, ter, ter?... Porque esse comportamento foi implantado pela mamãe natureza. Quantas mulheres não se jogam pra cima desses caras? É o velho jogo, camaradinha... É o velho jogo. Inconscientemente ou não, é o que acontece, velho.
- Mas eu sou muito feliz com minha patroa. Não tô a fim de ficar rico pra pegar mulher e...
- Eu sei, cara, eu sei... Mas o implante está aí, fincado no seu DNA, nos cantos mais recônditos do seu sistema límbico. Está em todos nós. Seu comportamento é condicionado por essa diretriz da natureza. Tu é um cachorrinho de Pavlov dela.
- Então quer dizer que a corrupção deslavada tem a ver com a libido?
- Tudo a ver, brother. Muita gente faz de tudo para ter. Ter dinheiro, ter poder. Mesmo que não pretenda espalhar seus genes, mas o condicionamento tá lá. Se as pessoas trabalhassem para controlar seus impulsos, se pelo menos tivessem consciência de que muitas vezes estão agindo como animais irracionais, por instinto, talvez não houvesse tanta bandidagem no mundo.
- Os traficantes, os ladrões, os seqüestradores... Essa gente toda então age pra satisfazer seus instintos mais primitivos?
- Podes crer.
- Sei não. Só sei que vou fazer minha fezinha de qualquer jeito. E se eu ganhar, sabe o que mais eu quero fazer?
- O quê?
- Vou mandar bater no Aristóteles.
- Nisso eu concordo contigo.
- Vou contratar um pessoal barra-pesada.
- E pau no Totó!
- É!

Filósofos de rua em tempo integral, Pratão e Pipócrates discordam em tudo, mas um sentimento os une: o ódio a Aristóteles Omorris.

quarta-feira, maio 23, 2007

TRECHO DE "O AMIGO DE PRAGA"

Dez dias depois de enviar uma resposta à sua avó, Dennis recebeu outra carta postada em Alto Paraíso. No envelope, por fora, estava escrito que a remetente era Matilde Campelo, mas constatou-se, depois de aberto o lacre, que quem assinava a carta era, para júbilo do destinatário, Etê. Emocionado, Dennis pôs-se a percorrer as linhas enfeitadas com uma letra firme e elegante, pequena, mas completamente legível.

"Salve, Dennis, grande amigo, virtual irmão,

"É com imenso prazer e inenarrável alegria que informo que foi assinada minha carta de alforria. Partiu ontem para destino incerto o tenente René Amarante. Segundo Prudente, o militar disse que a Aeronáutica estava literalmente esquecendo o caso, que iria adotar uma postura passiva, ou seja, de esperar pelos acontecimentos. Ótimo para mim, que pude ficar por mais que alguns minutos debaixo do Sol; que pude admirar sem receio as belezas da fazenda; que poderei conhecer novas pessoas.
"Prudente disse-me que revelou a Juraci que era eu quem estava no aparelho acidentado. Não sei bem a razão, mas foi depois desse fato que Juraci passou a, digamos, evitar uma maior aproximação. Seu avô também instruiu-me a adotar a identidade de um jogador tcheco de vôlei. Decidi considerar-me um meio-de-rede, devido à minha avantajada altura. Pode notar que andei acompanhando eventos esportivos pela televisão.
"Porém, algumas coisas vêm me intrigando, caro Dennis. Minha mente é como que uma caçarola com uma água que nunca cessa de ferver, dominada que é por um batalhão de dúvidas. Quanto maior o volume de informações, mais indagações surgem. O saber só quer saber de saber mais.
"Aqui vão alguns exemplos de minhas correntes inquietações:
1) Havia mesmo a imperiosa necessidade de esconder-me das autoridades? Teoricamente não há ninguém mais habilitado que elas para descobrir quem eu sou. Se eu for um piloto de testes da Força Aérea Brasileira, pronto: estava desfeita a confusão. Se eu estivesse em missão para um país estrangeiro, as autoridades brasileiras providenciariam minha repatriação. Apresentei estas questões a Prudente. Ele tergiversou, hesitou e disse, sem convicção, que temia que a Aeronáutica dispensasse a mim um tratamento inadequado. Foi o que ele disse, embora com outras palavras. Com muitas outras palavras, aliás. Matilde disse que eles iriam encher-me de perguntas, às quais eu não poderia responder devido ao meu lastimável estado. Disse ainda que iriam drogar-me e enfiar-me num quarto de hospital com grades. Mas por que fariam uma coisa dessas? Por ter eu sofrido um acidente? Pelo que tenho lido, as vítimas de sinistros são tratadas com uma certa complacência, são cercadas de cuidado e atenção. Pedi a Prudente que me leve ao local da queda qualquer dia desses, agora que estamos livres de Renê. Ele limitou-se a perguntar 'pra quê, se não tem mais nada no local, se limparam a área?' Pedi que ao menos me ensinasse a direção, pois, como já lhe disse, a primeira coisa de que me lembro não é do aparelho acidentado, nem de como deixei o lugar. Ele ficou de pensar no assunto.
2) Por que não ir à imprensa? Com a minha foto estampada nos jornais, nas revistas, na TV e em cartazes provavelmente ela seria vista por alguém que me conheceu durante o 'inverno da campanha de minha vida'. Prudente replicou com a óbvia resposta de que a Aeronáutica também tomaria conhecimento das fotos e então voltaríamos à primeira dúvida. Mas eu devo ter parentes como todo mundo, ou não? Matilde afirmou que, com certeza, minha memória voltará. Dessa forma eu mesmo procurarei minha família. Mas qual o estado emocional desses supostos parentes, que não sabem se estou vivo ou morto? Não teria sido melhor permanecer mudo e naquele estado de confusão mental do que ter consciência suficiente para atentar a tais interrogações?
3) Sou só no mundo ou há outros como eu? Cada dia que passa essa pergunta toma mais conta dos meus pensamentos. Pois os dias vêm e vão e não consigo encontrar, nos livros ou na vida real, algo — ou alguém — que me seja similar, psíquica e fisiologicamente falando. Esta manhã mesmo eu resolvi ajudar Prudente e os rapazes com o leite que todos os dias eles levam para a cidade. Sozinho colocava com tranqüilidade dois galões cheios na caminhonete. Todos se espantaram, pois muitas vezes eram necessários dois homens para carregar um galão. Prudente disse a eles que eu era atleta. Foi então que um deles declarou que conhecia jogador de futebol que não era capaz de arrancar a rolha de uma garrafa. Uma hora mais tarde eu brincava com o cachorro dos garotos de Juraci. Jogava bem longe um pedaço de madeira e o alcançava antes que o próprio animal o fizesse. Isto tudo para pasmo dos 'expectadores'. Juninho me perguntou se era eu quem dera um 'pulão' na beira do córrego em determinada ocasião. Respondi que já pulei tanto que não me lembro de todos meus 'pulões' de forma individual.
"Os exemplos acima expostos proporcionaram-me pelo menos uma conclusão. Uma, diga-se, dolorosa conclusão: vocês estão escondendo alguma coisa de mim. Um maior e não revelado aspecto da situação geral das coisas é a causa das respostas evasivas, insuficientes e proferidas em tom inseguro. Não sei exatamente o que escondem, apenas especulo. O fato é que pelo mundo afora não é corriqueiro encontrar pessoas como eu. Pelo que aprendi sobre a República Tcheca, por exemplo, os homens de lá não apresentam uma pele com a mesma textura da minha; eles não saltam até trinta metros partindo do chão; nem ficariam ilesos com a queda; não correm a cerca de noventa quilômetros por hora; não levantam um trator a um metro do chão. Como também aprendi que um tcheco, ou um europeu de modo geral, não difere cromossomicamente em nada de um africano ou de um asiático, que a pele é uma reles capa para proteger o corpo, não importa a cor; e que a igualdade entre os homens impera por baixo da pele, a conclusão a que cheguei é que não há muitos obstáculos que me impeçam de duvidar de minha humanidade.
"Pesquisei em livros e enciclopédias se existe uma doença que deixe uma pessoa no meu estado. Pelo contrário, descobri por intermédio de minhas leituras que um dos maiores anseios do homem é o poder. As pessoas nunca estão satisfeitas com sua força, seja ela física, moral, econômica ou política. Por isso buscam todos os meios de aumentá-la, mesmo que o processo venha a prejudicar a outrem. Esta a causa da infelicidade que grassa no mundo. A vida do homem parece ser um vasto deserto de infelicidade salpicado de poucos oásis de felicidade em alguns pontos. Logo, amigo Dennis, não sou portador de nenhuma moléstia crônica, a menos que seja o precursor de uma nova doença, não catalogada pela medicina. O que sou, então?
"Não levei estas conclusões aos seus avós. Sinto em seus olhos uma sincera e profunda boa vontade para comigo. Se vocês escondem alguma coisa, isto acontece porque vocês querem proteger-me. Não sei bem de quê. Nem quero falar de minhas cogitações, pois elas incluem hipóteses que vão do absurdo ao ridículo. Espero apenas que alguém me diga a verdade. Você, por exemplo. Será que se você me contar tudo o que sabe - ou o que acha que sabe - de alguma forma não estará me ajudando a recobrar meu passado? Ou vocês conhecem meu passado e ele é tão sujo, sórdido e condenável que merece permanecer enterrado?
"São tantas dúvidas que é melhor eu ficar por aqui. Não quero implodir sua cabeça também. Mas mantenha a calma. Prometo que ficarei aqui a aguardá-lo, que não cometerei nenhuma loucura. Excetuando-se meu inferno interior, o inferno das questões indecifráveis, estou no paraíso. Adoro este lugar e sua gente. Prometo que o espero para julho. Palavra de honra, palavra de um cavaleiro tão magro e cabeçudo como o galante Dom Quixote de la Mancha. E você, como eu, deve ter lido que as palavras de um cavaleiro são mais sólidas que toda a solidez somada de todas as rochas do mundo.
"Um abraço, não muito forte, de seu pálido amigo

Ernst Etevaldo Tchapek"

sexta-feira, maio 18, 2007

ARISTÓTELES OMORRIS - 18/5/2007

O homem que iria ser santo

Aristóteles Omorris

Monte, Sinai - Certa vez, depois de mais um dia cansativo neste planeta atrasado (é duro ser um indivíduo muitas gerações à frente do seu tempo), em que tive de continuar fingindo ser apenas mais um ser superdotado na multidão (oh, que stress! – estresse é para pobre), acabei recebendo um telefonema que serviu para colocar algum bálsamo benfazejo em meu coração.
Tratava-se de um apelo – uma quase-súplica – do Vaticano para que eu aceitasse ser canonizado pela Igreja Católica. Haveria uma bela cerimônia na Praça de São Pedro, com todas as pompas e circunstâncias possíveis, tudo aos olhos do mundo inteiro.
Ainda que relutantemente, aceitei. Comparado ao meu grau de evolução, um santo não passa de uma ameba ascética. Mas, magnânimo que sou, quis dar uma imensa alegria ao Sumo Pontífice e a todos os católicos da Terra. Afinal, não é todo dia que uma pessoa é canonizada em vida.
Chegando ao Vaticano, fui recebido pelo então seminarista Joseph Ratzinger. Imediatamente dois bufantes membros da Guarda Suíça me deram os braços e me carregaram para os aposentos papais. Certamente – pensei - fizeram tal ação para me poupar do cansaço proporcionado pelas caminhadas pelos gigantescos e intermináveis corredores da humilde morada do sucessor do pobre pescador Pedro.
Ao me ver, o Santo Padre foi logo ajoelhando-se (meus detratores dizem que naquele momento ele apenas escorregou na barra de suas modestas vestes. Favor não ligar para os invejosos). Depois de dizer algumas palavras em latim arcaico, o papa ordenou que todos fossem para fora, para a praça.
Lá os guardas me amarraram a uma cruz, colocada em um ponto mais elevado e cercada de palha cerca por todos os lados. Homens encapuzados e portando tochas subiram as escadas e se aproximaram de mim, enquanto o papa declarava a uma multidão ensandecida de felicidade: “Que seja consumado o processo de carbonização!”
Imediatamente eu sorri, tranqüilo e sereno (embora sentisse algo escorrendo pelas minhas pernas), e disse que estava havendo um engano. “Ao telefone me disseram que eu seria canonizado”, informei-lhes.
“Não, o senhor será carbonizado”, afirmou aos sussurros um dos homens da tocha, que logo percebi ser o jovem e simpático Ratzinger. Foi então que perdi a paciência e acabei revelando algumas de minhas atividades secretas, que sempre exerci em favor dos seres deste planeta. “Houve algum engano, Santo Padre! Meu nome é Aristóteles Omorris. Sou amigo dos maiores líderes deste mundo, os atuais governantes de Itália e Alemanha! Enquanto católico fervoroso, sou conselheiro especial da Opus Dei, uma espécie de Henry Kissinger do bem!”
O papa respondeu que não havia engano algum. Eu é que havia escutado mal. “A Igreja não queima ninguém há séculos, mas no seu caso abrimos uma exceção”, disse ele.
Resignado com meu destino de mártir, como uma futura Joana d’Arc de saias, ainda encontrei forças para amaldiçoar o titular deste blog e os sacripantas Pratão e Pipócrates, porque, tenho certeza, foram eles os responsáveis por aquela armação. Eles sempre desejaram – e ainda desejam – eliminar o objeto-mor de sua inveja. Enquanto eu existir, eles estarão cientes de sua pequenez.
Mas quando os portadores da tocha começaram a curvar-se para atear fogo na palha que me circundava, eis que um milagre aconteceu, a justiça divina fez-se presente. Deus não deixaria que tal crime fosse cometido contra um seu igual.
Alguém deu um recado ao papa, que de imediato chamou todos os seus acólitos para a sala de reuniões. Inclusive os homens da tocha. Mais tarde vim a descobrir o motivo: os espiões do Vaticano haviam acabado de saber que alguns canalhas estavam ajudando judeus a fugir para as Américas. Fugir do quê, eu não sei. Só sei que o papa ficou furioso e rapidamente passou a deliberar com sua cúpula modos de neutralizar ações ultrajantes como aquela.

Aristóteles Omorris foi coroinha por 23 anos, mais da metade dos quais gozando de enorme amizade com o padre Zequinha Perobus

quinta-feira, maio 10, 2007

PRATÃO, PIPÓCRATES E O PAPA

- Ué, já voltou de São Paulo, Pipócrates?
- É.
- Você está nervoso. O que foi? Não viu o papa?
- Vi. Até conversei com ele.
- Nossa! Então tu tinha que estar sorrindo até pros mendigos na rua.
- Aquele canalha...
- Que canalha?
- O papa, lógico.
- Não estou entendendo. O que ele te fez?
- O maldito primeiro me recebeu com sorrisos. Depois, fechou a cara e me deu as costas. Tentei continuar falando com ele, mas os guarda-costas me empurraram.
- Humm... Tô começando a entender... Que que tu aprontou, Pipócrates?
- Nada demais...
- Fala, porra!
- Bom, eu cheguei no papa, beijei a mão dele, ele pôs a mão na minha cabeça, os troços de praxe, sabe?
- Mas...
- Mas quando eu pedi pra ele abençoar a cópia do Alcorão que eu levava...
- Ah, tenha a santa paciência!
- Ele é que devia ter, pô!
- Rarrarrá! Isso é que dá um camarada pertencer a cinco religiões ao mesmo tempo...
- Calaboca, ateu dos infernos!
- Você é cinco vezes marionete da natureza.
- Ah, não! Aquela história de novo? O que aquela lorota de que não existe livre-arbítrio, de que todo mundo é escravo da natureza e blábláblá tem a ver com religião?
- Tudo a ver. Tudíssimo!
- Da outra vez tu comparou a gente com os animais irracionais. Pois bem: que outro bicho além do homem tem religião?
- Nenhum. Porque somente o ser humano tem consciência de si, do outro e do universo que o cerca. Logo, ele tem consciência da morte. Logo, ele precisava desenvolver, guiado pela sórdida madrasta natureza, subterfúgios para justificar a continuidade da sua vida, enquanto indivíduo, e da humanidade. Logo, o medo da morte é o pai da religião.
- Isso porque você acha...
- Qualquer um que pense sem amarras de qualquer tipo, sem idéias preconcebidas, sem preconceitos embutidos, qualquer um que pense livremente chegaria à mesma conclusão. O ser totalmente racional despreza todo tipo de superstição – religião incluída.
- O ser totalmente racional é um filho da puta!
- Induzido pela lei de perpetuação das espécies imposta pela natureza, o homem inventou deuses e religiões. Quando teve consciência de si e, logo depois, quando soube que iria morrer, ele precisou encontrar refúgio em algo fora da compreensão humana, algo que lhe desse motivação para continuar vivendo. Sabendo que pereceria, qual o sentido de prolongar a existência, de perpetuar a espécie?
- Bullshit!
- Foi assim que Deus nasceu. Foi assim que surgiram os mitos sobre o além-da-morte. Foi assim que surgiram a ética e a moral. Tudo invenção humana, inspirada pela natureza, para que o homem continuasse confortável com a idéia de viver. A mentira é a seguinte: “Viva, reproduza-se, comporte-se bem que você terá uma vida ainda melhor depois que morrer! Sim, a vida não acaba com a morte!”
- Quer dizer que, em sua ignominiosa opinião, também a ética e a moral são parte do plano sinistro da natureza pra forçar o homem a fazer o que ela quer?
- Claro que sim. Comportando-se bem, os homens não se matam totalmente uns aos outros e ficam disponíveis para perpetuar a espécie. Quanto mais gente viva, mais prole a caminho. Eis o grande plano da natureza. O grande lance é sobreviver para reproduzir.
- Balela, pô! Foi cientificamente provado que pacientes que têm fé ou tenham quem reze por eles se recuperam com mais facilidade.
- A fé nada mais é que um exercício inconsciente de auto-hipnose. A pessoa convence a si própria de que existe algo mais e, com isso, obtém bons resultados no aspecto mental, que, como se sabe, influencia o aspecto físico, por meio da química corporal. Em suma, a fé é um tipo de livro de auto-ajuda implantado na mente humana. Se ela for feliz com isso, tudo bem: ótimo, beleza. Aliás, isso é tudo o que a natureza quer.
- Tu é um estraga-prazer do cacete! Quer dizer que tu não acredita em alma eterna, anjos, espíritos, ressurreição, reencarnação, nada?
- Claro que não. Pensar sem nos deixar levar por nossos desejos nos leva a duvidar de tudo. É difícil de aceitar, pois a natureza atua fortemente na direção contrária. Ela quer nos fazer acreditar em algo mais. Mas tem um lado positivo nisso.
- E qual é?
- Sem reencarnação, ressurreição ou sobrevivência da alma, o mundo ficará livre do Aristóteles quando ele morrer.
- Que beleza! Eu não tinha pensado nisso...
- Pois é. Livre para sempre.
- Vai com Deus, Totó!

Filósofos de rua em tempo integral, Pratão e Pipócrates discordam em tudo, mas um sentimento os une: o ódio a Aristóteles Omorris.

sexta-feira, maio 04, 2007

DUAS FRASES E UNS VERSINHOS

Era daqueles que diziam "desta água jamais beberei". Morreu de sede.

*

Mesmo tendo morrido por overdose de calmantes, no velório notaram-lhe rugas de aborrecimento.

*

CONTENTAI-VOS

Vós não estais mortos
Vós ainda ostentais consciência
Vós tendes capacidade para fazer tanto
Gozais de incontáveis possibilidades
E ainda assim temeis tudo
O ontem, o hoje e o amanhã
Por isso não visiteis São Francisco
Que, aflita e há muito,
Espera pelo Big One

SEÇÃO DELÍRIOS: OPERAÇÃO GÁVEA

A segunda edição da Seção Delírios surgiu do desespero de ver meu time jogar em Montevidéu, há dois dias. Subitamente, brotou a sensação de que somente um gênio da lâmpada ou um investidor russo poderia dar jeito no Flamengo, o time de maior torcida do mundo.

Digamos que me aparecesse um magnata com fortuna semelhante à do Bill Gates, adorador do futebol. Disposto a investir na maior paixão esportiva do planeta, ele decide vir ao país do futebol. Nada mais natural que escolhesse o clube mais popular desse país.

Sua proposta: comprar 11 jogadores, quaisquer que sejam eles, tenham o preço que tiverem, estejam onde estiverem e formar um supertime titular. O restante do elenco seria composto pelos melhores que ficassem no clube e mais grandes jogadores de outros clubes brasileiros. Em troca ele ficaria com os lucros obtidos com a venda de produtos ligados ao clube da Gávea pelo mundo afora. O que não seria pouco, haja vista o extenso rol de títulos que passaríamos a conquistar pelo universo.

Humildemente eu me ofereceria para escolher nossos atletas, levando em conta que, pelas leis futebolísticas brasileiras, somente três estrangeiros podem atuar ao mesmo tempo. Assim, contrataria apenas os três gringos da cota, pois não faria sentido trazer um não-nacional para esquentar o banco. Não sei... acho até que o técnico seria eu mesmo.

Dinheiro na mão e liberdade para contratar, os 11 titulares do meu Super-Mengão seriam:

Júlio César; Cicinho, Alex, Juan e Daniel Alves; Gerrard, Lampard, Kaká e Ronaldinho Gaúcho; Messi e Ronaldo.

O melhor goleiro do mundo é o italiano Buffon, mas eu não poderia queimar uma vaga para estrangeiro preenchendo uma posição em que o Brasil não é carente. Então prefiro trazer de volta o grande rubro-negro Júlio César, que é da Seleção, oras.

Na lateral-esquerda resolvi escalar um lateral-direiro porque o mundo anda carente de bons jogadores na posição que já teve mestres como Júnior e Nilton Santos. Detalhe: estes dois são destros como o Daniel Alves, para quem eu tinha que arranjar um lugar no meu time sem ter que dispensar um Cicinho.

Minha dupla de volantes, como você viu acima, é inglesa. Infelizmente, no Brasil, ainda não temos a cultura de utilizar volantes que não se limitam a marcar. O mundo praticamente já abandonou o chamado brucutu, o sujeito que fica à frente dos zagueiros distribuindo bordoadas, fazendo faltas perigosas, levando cartões e que, quando rouba a bola, volta a entregá-la ao adversário por não ter qualidade no passe.

Gerrard e Lampard são a melhor representação do jogador total: marcam com tenacidade, sem violência, e saem jogando com habilidade, ótimos passes e excelente visão de jogo. E ainda marcam muitos gols. Nessa categoria eu ainda poderia incluir o alemão Frings, os espanhóis Xavi e Fabregas, o francês Vieira e o italiano Pirlo. Entre os brasileiros, alguns volantes conseguiram superar o figurino brucutúnico, embora ainda não estejam no nível dos europeus citados: Mineiro, Josué, Tinga, Lucas e, em menor grau, Gilberto Silva.

Do meio para a frente, junto aos brasileiros Kaká, Ronaldinho Gaúcho e Ronaldo (não tem artilheiro como o Fenômeno), só podia ser o Messi, que tem um potencial maior que o de Robinho, Cristiano Ronaldo e todos os outros segundos atacantes que surgiram nos últimos tempos.

Em suma, meu Mengão dos sonhos até que é extremamente mais ou menos, não?

Agora vamos aos jogadores que comporão o restante do elenco:

Bruno, Diego, Léo Moura, Alex Silva, Miranda, Kléber, Lucas, Josué, Renato Augusto, Zé Roberto (Santos), Zé Roberto (Botafogo), Fernandão, Dagoberto e Araújo.

Pronto. Agora é só esperar o tal investidor chegar, acertar as contratações e botar o time pra jogar. Em dezembro de 2008, espero estar no Japão, fazendo a final do Mundial com o Barcelona. Ou o Real Madrid. Ou o Chelsea. Ou o Milan. Não importa: quem vier vai perder de 4 a 0.