sexta-feira, maio 18, 2007

ARISTÓTELES OMORRIS - 18/5/2007

O homem que iria ser santo

Aristóteles Omorris

Monte, Sinai - Certa vez, depois de mais um dia cansativo neste planeta atrasado (é duro ser um indivíduo muitas gerações à frente do seu tempo), em que tive de continuar fingindo ser apenas mais um ser superdotado na multidão (oh, que stress! – estresse é para pobre), acabei recebendo um telefonema que serviu para colocar algum bálsamo benfazejo em meu coração.
Tratava-se de um apelo – uma quase-súplica – do Vaticano para que eu aceitasse ser canonizado pela Igreja Católica. Haveria uma bela cerimônia na Praça de São Pedro, com todas as pompas e circunstâncias possíveis, tudo aos olhos do mundo inteiro.
Ainda que relutantemente, aceitei. Comparado ao meu grau de evolução, um santo não passa de uma ameba ascética. Mas, magnânimo que sou, quis dar uma imensa alegria ao Sumo Pontífice e a todos os católicos da Terra. Afinal, não é todo dia que uma pessoa é canonizada em vida.
Chegando ao Vaticano, fui recebido pelo então seminarista Joseph Ratzinger. Imediatamente dois bufantes membros da Guarda Suíça me deram os braços e me carregaram para os aposentos papais. Certamente – pensei - fizeram tal ação para me poupar do cansaço proporcionado pelas caminhadas pelos gigantescos e intermináveis corredores da humilde morada do sucessor do pobre pescador Pedro.
Ao me ver, o Santo Padre foi logo ajoelhando-se (meus detratores dizem que naquele momento ele apenas escorregou na barra de suas modestas vestes. Favor não ligar para os invejosos). Depois de dizer algumas palavras em latim arcaico, o papa ordenou que todos fossem para fora, para a praça.
Lá os guardas me amarraram a uma cruz, colocada em um ponto mais elevado e cercada de palha cerca por todos os lados. Homens encapuzados e portando tochas subiram as escadas e se aproximaram de mim, enquanto o papa declarava a uma multidão ensandecida de felicidade: “Que seja consumado o processo de carbonização!”
Imediatamente eu sorri, tranqüilo e sereno (embora sentisse algo escorrendo pelas minhas pernas), e disse que estava havendo um engano. “Ao telefone me disseram que eu seria canonizado”, informei-lhes.
“Não, o senhor será carbonizado”, afirmou aos sussurros um dos homens da tocha, que logo percebi ser o jovem e simpático Ratzinger. Foi então que perdi a paciência e acabei revelando algumas de minhas atividades secretas, que sempre exerci em favor dos seres deste planeta. “Houve algum engano, Santo Padre! Meu nome é Aristóteles Omorris. Sou amigo dos maiores líderes deste mundo, os atuais governantes de Itália e Alemanha! Enquanto católico fervoroso, sou conselheiro especial da Opus Dei, uma espécie de Henry Kissinger do bem!”
O papa respondeu que não havia engano algum. Eu é que havia escutado mal. “A Igreja não queima ninguém há séculos, mas no seu caso abrimos uma exceção”, disse ele.
Resignado com meu destino de mártir, como uma futura Joana d’Arc de saias, ainda encontrei forças para amaldiçoar o titular deste blog e os sacripantas Pratão e Pipócrates, porque, tenho certeza, foram eles os responsáveis por aquela armação. Eles sempre desejaram – e ainda desejam – eliminar o objeto-mor de sua inveja. Enquanto eu existir, eles estarão cientes de sua pequenez.
Mas quando os portadores da tocha começaram a curvar-se para atear fogo na palha que me circundava, eis que um milagre aconteceu, a justiça divina fez-se presente. Deus não deixaria que tal crime fosse cometido contra um seu igual.
Alguém deu um recado ao papa, que de imediato chamou todos os seus acólitos para a sala de reuniões. Inclusive os homens da tocha. Mais tarde vim a descobrir o motivo: os espiões do Vaticano haviam acabado de saber que alguns canalhas estavam ajudando judeus a fugir para as Américas. Fugir do quê, eu não sei. Só sei que o papa ficou furioso e rapidamente passou a deliberar com sua cúpula modos de neutralizar ações ultrajantes como aquela.

Aristóteles Omorris foi coroinha por 23 anos, mais da metade dos quais gozando de enorme amizade com o padre Zequinha Perobus

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