quinta-feira, agosto 02, 2007

CONTO DIALÉTICO-METAFÓRICO-ALEGÓRICO-SIDERAL


Imperatividade

- Em nome do povo umabaraúna, habitante deste humilde mundo, eu, Kaligino dos Helpécidos, saúdo nossos visitantes.
- Eu sou o general Rahms Pheld, representante da Oops, Organização Onisciente dos Planetas do Sistema. Minha missão é de exploração, sempre em busca de novos aliados para nossa união de mundos, que já conta com 210 civilizações. Asseguro-lhes que nossos povos são eminentemente pacíficos.
- Tudo bem, mas pra que servem aqueles instrumentos nas mãos de seus acompanhantes? E aqueles imensos cilindros que ornam sua nave?
- São armas. Mas só para defesa.
- Mas, se vocês são pacíficos, por que precisam de armas?
- Porque há povos que, por ignorância ou outro motivo qualquer, rejeitam nossa presença ou até mesmo nossa mera existência. Existem povos que repelem qualquer tipo de contato com outros mundos, muitas vezes usando violência para atingir seu objetivo.
- Por que simplesmente não respeitar a vontade desses outros povos?
- Bem... Hã... Às vezes a defesa passa a ser uma questão de sobrevivência. Por exemplo: nossos sensores detectaram a presença de grandes animais em seu mundo. Quando vocês são surpreendidos por um deles, vocês não usam armas para defender suas vidas?
- Claro que não, amigo!
- Vocês não reagem?
- Obviamente temos um instinto de sobrevivência, de preservação da espécie. Mas nunca a custo do extermínio de outra. Podemos tentar fugir, nos esconder, mas ferir ou matar, jamais!
- E quando não há como fugir ou esconder-se?
- É a vida... Chegada a nossa hora, não há o que fazer.
- Vocês não matam nem para comer?
- Que tipo de absurdo é esse? Matar para comer? Isso é... isso é simplesmente deprimente, descabido, horroroso... Eu nunca... Então seu povo mata outros seres vivos para comê-los?
- Sim. São fontes de proteína...
- E você disse que usava essas... essas armas somente para defesa...
- Só comemos seres irracionais.
- O irracional tem menos direito à vida que o racional? Por quê?
- Deixemos de lado essas questões filosóficas, por enquanto. Gostaríamos de iniciar um entendimento diplomático.
- Como?
- Será que o tradutor universal não está funcionando direito, tenente?
- Tudo em ordem, senhor. Todas as unidades estão funcionando perfeitamente.
- Ótimo. Caro Kagilino...
- Kaligino.
- Sim. Caro Kaligino, nosso governo ficaria muito honrado se seu planeta passasse a fazer parte da Oops.
- Ficamos lisonjeados por pensarem assim.
- Para que isso aconteça, traremos nosso pessoal para dar início aos trâmites de praxe. Isto, claro, se vocês concordarem.
- Certamente. E o que ganharíamos com nossa adesão a sua organização?
- Vocês teriam acesso a todo o nosso conhecimento científico, cultural e tecnológico. Poderiam desfrutar de todo o conforto, comodidade e prazeres dos quais dispõem qualquer cidadão de qualquer um dos planetas que fazem parte da Oops. Nós criamos coisas com as quais vocês jamais sonharam.
- Talvez porque nunca tenhamos precisado delas.
- Ora, vocês não têm naves, não têm veículos de espécie alguma, andam nus... Vocês... Vocês me dão nojo!
- Há milênios somos felizes vivendo desse jeito. Por que mudar? A troco de quê?
- A troco de nossa amizade! Vou deixar uma infinidade de dados sobre as mais avançadas civilizações que compõem nossa organização. No próximo mês eu volto para ter uma resposta de vocês. Que vocês se reúnam, que façam congressos, assembléias, votações, o que for. Daqui a um mês vocês me dão uma resposta, combinado?
- Como desejar, general. Vocês sempre serão bem-vindos ao nosso mundo.
- Olha só aquela velha horrível! Deveria ser coberta à força!
- Horrível? Não entendi esse conceito.
- Digamos que ela seja totalmente desprovida de beleza.
- Mas ela é um ser tão maravilhoso.
- Falo de beleza física, meu caro.
- Quer dizer que, coberta, ela ficaria mais agradável aos seus olhos?
- Não é bem assim. É indecente!
- Mas ela sempre praticou o bem assim, descoberta. Há algo mais decente que isso?
- Está bem, está bem. Não estou aqui para julgar seu povo!
- Ao matar outros seres vivos, vocês usam roupas ou não?
- Até o próximo mês... amigo.

***

- Olá outra vez, Kaligino dos Helpécidos.
- Seja novamente bem-vindo, general Rahms Pheld. Vejo que desta vez você trouxe um número muitíssimo maior de acompanhantes e de naves. E quão imensas elas são! Parabéns ao seu povo por tais maravilhas tecnológicas.
- Em nome do governo da Organização Onisciente dos Planetas do Sistema solicito que me informe a resposta de seu mundo ao nosso convite de ingresso na Oops.
- Bem, general, como eu já previa, todos os umabaraúnas consultados resolveram não aceitar sua oferta de repasse dos chamados “avanços científicos”, embora todos tenham adorado estudar sua cultura por meio das informações que você nos forneceu.
- Quer dizer que não vão aceitar nossa amizade?
- Pelo contrário. Aceitamos sua amizade sem pedir nada em troca. Vocês serão sempre bem-vindos ao nosso mundo para nos fazer visitas à hora que quiserem. Apenas decidimos não mudar nosso modo de vida, o que aconteceria se aceitássemos sua tecnologia e sua estada de forma permanente.
- Então é assim? Pois bem, “amigos”. Tenente, providencie o desembarque de todas as nossas tropas. Depois traga os técnicos e os burocratas.
- Então já podemos começar a invasão, senhor?
- Quem falou em invasão, tenente? Vamos fazer mais uma ocupação, entendeu?
- Sim, senhor.
- Espero que em menos de um mês comecemos a enviar os primeiros carregamentos de minérios e de carne.
- Vocês não podem ferir nosso mundo!- Sai da frente e cala essa boca, velho imundo! Coloquem uma roupa nele! Vou mostrar a essa gente o verdadeiro significado da amizade!

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